EDITORIAL

PALAVRA FIANDEIRA é um espaço essencialmente democrático, de liberdade de expressão, onde transitam diversas linguagens e diversos olhares, múltiplos olhares, um plural de opiniões e de dizeres. Aqui a palavra é um pássaro sem fronteiras. Aqui busca-se a difusão da poesia, da literatura e da arte, e a exposição do pensamento contemporâneo em suas diversas manifestações.
Embora obviamente não concorde necessariamente com todas as opiniões emitidas em suas edições, PALAVRA FIANDEIRA afirma-se como um espaço na blogosfera onde a palavra é privilegiada.

domingo, 23 de janeiro de 2011

PALAVRA FIANDEIRA - 52

PALAVRA FIANDEIRA 
REVISTA LITERÁRIA
REVISTA DIGITAL DE LITERATURA
ANO 2 — Nº 52 — 24 JANEIRO/2011

NESTA EDIÇÃO:
GILBERTO MARCHI
O ARTISTA COM O ESCRITOR FRANCISCO MARINS

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1. Quem é Gilberto Marchi?
Desde pequeno sempre gostei de desenhar e tocar piano. Meu 1º desenho foi com 3 anos de idade. Iniciei meus estudos de desenho e pintura com José Roncoleto (Lubra), em 1963. A partir de 1964, comecei a trabalhar para a Galeria de arte André. De 1970 a 1976 lecionei desenho e pintura na Escola Panamericana de Arte. Foi lá que tive mais contato com o universo da ilustração. Indicado por Mario Tabarin, fui à Editora Abril, para ilustrar para a revista Exame e acabei por tabela, ilustrando para a revista Realidade. Daí em diante, não parei mais e ilustrei para quase todas as revistas da Abril.

2. Completa 37 anos como ilustrador. É uma trajetória exemplar. Tem a lembrança da primeira ilustração que realizou profissionalmente?
Sim, chamou-se “A revolução dos cravos”. Foi para a Realidade, tendo como tema a queda do governo de Salazar, em Portugal.

3. Já realizou capas de revistas, como a Revista Época Nº 747. Qual é a sua sensação ao saber que uma capa com a sua arte estará nas bancas, exposta para milhares de olhares?


A sensação é a de ter feito algo que pode mexer com as pessoas. Você deixou de ser um desconhecido.

4. Orgulha-se de ter ilustrado a capa de um livro do escritor Francisco Marins. Fale-nos sobre esse trabalho.


Sim, pois foi um escritor que sempre admirei. O livro chama-se Clarão na Serra e a ilustração foi realizada com guache.

5. Tem originais na galeria da Editora Nacional/IBEP. Pode nos contar sobre isso?
Fiz muitos desenhos para livros de português e história do IBEP na década de 70. Além disso, fiz capas para os livros de Ciências.

6. Realiza cursos para jovens com vocação artística. Poderia, por favor, nos falar desses cursos?

 O artista realizando oficina
Tenho alunos em vários níveis. Vários já são profissionais. Leciono desenho, pintura e técnicas variadas, desde o lápis de cor à pintura a óleo. Para quem se interessar, os detalhes estão no meu blog:
http://gilbertomarchi.blogspot.com

7. Já produziu capas de disco de vinil, o clássico Long Play. Conte-nos sobre essa experiência...
Fiz duas capas. A primeira foi para um disco de “dancing” e outra para um disco de “Clássicos dos clássicos”.

8. Já teve capa de livro premiada. Poderia nos dizer, quais livros, para quais editoras, e os prêmios? Ou pelo menos uma dessas premiações?

O médico e o monstro
No MASP , numa das exposições da CIB- Clube de Ilustradores do Brasil - fui premiado com ouro pela capa do livro de bolso “O Médico e Monstro”da Editora EDIBOLSO. Tenho vários prêmios de ouro, prata e menções honrosas, tanto como pintor e como ilustrador.

9. Está presente com a sua arte na vida das coisas que são, e as pessoas, eventualmente, nem se dão conta. Já ilustrou até embalagens. Fale, por gentileza, sobre esse trabalho.


O ilustrador muitas vezes está presente na casa das pessoas, nos produtos que elas consomem e raramente elas sabem quem fez as imagens impressas nas embalagens, salvo quando nos permitem assinar.
Eu ainda posso me orgulhar pelo fato de clientes terem pedido para que eu assinasse, pois minha assinatura valorizaria o seu produto. Uma delas foi a embalagem de lata do Café Itamarati.

10. Já fez ilustração para a revista PLAYBOY. Pode satisfazer a curiosidade de PALAVRA FIANDEIRA?
Já fiz muitas! Entre elas duas artes para o conto de Truman Capote” O Assassino que mandava presentes”. Fui por duas vezes indicado para o Premio Abril de Ilustração.

11. Seu histórico é amplo. Já realizou ilustração para o antigo CÍRCULO DO LIVRO. Pode nos dizer algo sobre isso?
Fiz várias artes, entre elas o retrato de Monteiro Lobato.

12. Já fez trabalho artístico para a geladeira Consul. Pode nos revelar isso? Como aconteceu o convite, qual a técnica utilizada, etc...


Esse foi uma série de artes bem divertidas. Uma delas era uma pescada branca dentro de bloco de gelo. Foram tantas artes que fiz, que um dia folheando uma revista Claudia, demorei para lembrar que aquela arte era minha. Nessa mesma série, fiz uma arte de forma de cubo, com frutas e legumes compactados.

13. Alguns de seus trabalhos são deveras curiosos. O que é Monanelore?
É a imagem da Monalisa, mas como uma vaca Nelore , para a Associação Gado Nelore.

14. Tem uma sólida parceria com a escritora Regina Sormani, sua esposa, e escritora de Literatura Infantil. Poderia nos contar como teve início essa parceria? Qual o primeiro livro dela que ilustrou? 

Livro infantil ilustrado pelo artista
Foram dois livros :” A Borboleta Bela e a Rosa Amarela” e “ Vovó e os Periquitos”, lançados pelas Paulinas. Juntos temos mais de 20 livros.

15. Aproveite e nos revele alguns títulos de Literatura Infantil que ilustrou, de autoria de Regina Sormani e de outros autores. Tem um que lhe deu um prazer especial?
Gosto de vários, mas o que mais gostei de ilustrar foi o livro de poesias Rebenta Pipoca, da Pioneira. Nunca ilustrei para outros escritores de livros infantis. Apenas didáticos.

16. Tem trabalhos realizados com personagens folclóricos das florestas brasileiras. Pode nos contar sobre essas encomendas?
Tenho telas com temas folclóricos que foram adquiridas por particulares. Uma delas foi o Curupira que está na coleção de um funcionário da Revista da Indústria- Fiesp.

17. Atuou artisticamente até para projetos imobiliários. Poderia nos expor verbalmente um desses trabalhos, nos contar sobre ele?
Realizei várias artes de edifícios e casas de alto padrão para as construtoras Godói e Inpar. São artes em aquarela, pastel seco, pastel oleoso,acrílico e lápis de cor.


18. Já ilustrou para livros didáticos, certamente. Pode nos falar sobre uma dessas criações?
— Para o Ibep, fiz perto de 400 artes para uma coleção de português da 1ª a 4ª séries.
19. Uma curiosidade latente: Já fez capas de gibis?
Ainda não , mas pretendo fazer em breve e não só a capa.

20. Como encara o prêmio na carreira de um artista ilustrador?
Como na carreira de qualquer profissional. O prêmio é um incentivo para seguir em frente.

21. Tem uma atuação discreta, mas um talento imenso. Acredita que a badalação não seja absolutamente necessária?
Prefiro que o trabalho fale por mim. Em geral a badalação é mais para “artistas” plásticos.

22. Participou do I Encontro de Escritores e Ilustradores de Literatura Infantil e Juvenil, em São Paulo. Como avalia a importância de Associações de Escritores e também Artistas ilustradores no Brasil?

 O artista com outros ilustradores
Foi na Livraria Cortez. Fiz uma oficina de aquarela. Temos dois livros lá. As associações são importantes para unir as classes e os profissionais.

23. Ilustrou para a Paulinas livros com temáticas ecológicas, como "A Baleia Azul".
Sim. Foi um livro de colagem, lançado em conjunto com outros dois: Mico Leão Dourado e Panda Gigante.

24. Literatura Infantil é só para crianças?
Depende. Há muitos livros infantis e infanto-juvenis que são também para o público adulto.

25 O que foi ou o que é o ILUSTRA BRASIL?

 Trabalho exposto no "Ilustrabrasil!"
O “Ilustrabrasil! “, é o nome das exposições anuais da SIB- Sociedade dos Ilustradores do Brasil, da qual sou conselheiro. Já fizemos 7.

26. Resumidamente, quais os problemas que mais afligem o ilustrador no Brasil?
Concorrência desleal, problemas com direitos autorais, clientes burros, o governo comendo a nossa perna com impostos.

27. Que palavras e mensagem deixaria aos futuros artistas e também aos leitores de PALAVRA FIANDEIRA?
Aos futuros artistas, que aprendam a desenhar, pintar e a não se contentar com pouco. Para a PALAVRA FIANDEIRA, agradeço a oportunidade de participar desta entrevista.
Um abraço do Gilberto Marchi


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PALAVRA FIANDEIRA — 
Fundada pelo escritor Marciano Vasques

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

PALAVRA FIANDEIRA — 51

PALAVRA FIANDEIRA
REVISTA LITERÁRIA
REVISTA DIGITAL DE LITERATURA
ANO 2 - Nº 51 - 16 JANEIRO 2011

NESTA EDIÇÃO:



Diretamente do CHILE
J. PELLICER
"O POETA DOS SORRISOS AZUIS"

Por Rocío L'Amar

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Juan Antonio Pellicer: 
visão e olhar:
luminiscência: 
poesia fotográfica

Entrevista concedida à Rocío L'Amar




A poesia requer sua própria luz. Busca o sentido da existência. É reveladora descobrindo o desconhecido. Sugere imagens através de olhares interiores criando uma visão real, um mundo exclusivamente

A fotografia também cria imagens estéticas e as documenta como instantâneas.

Entretanto, ambas utilizam uma conexão íntima — como linguagem poética - um disparador, isto é, o olho humano e o olho da câmara, para capturar a imagem "ao vivo", como único momento poético possível, onde reside a poesia fotográfica, segundo Pedro Meyer.

A arte não se converte em outro, senão que o acompanha. A poesia não se transmuta em fotografia, porém que surge decorrente da imagem enquanto onírica. A fotografia se revela como pretexto para que surja a poesias, e vice-versa. Se a foto reflete a luz, a palavra poética se encarrega de concretizar a matéria da luz, como essência da visão, de temas urbanos à olhares de gênero/existência, sexo, vida, amor, morte, oníricos, surrealista, melancólicos, entre outros, mantendo as constantes da forma criativa, tons ou tonalidades que vão desde a descrição à interpretação, jogos conceituais, união de sensações e conceitos que dão corpo à poesia fotográfica... Um poema unido à foto que chegue a fundir-se e que se tornem inseparáveis, que um complete o outro e vice-versa. Ainda que - é sabido - a imagem tenha uma força visual que nas palavras seja mental. E ainda que a foto seja uma arte do artificial, porque nasce com a ajuda da tecnologia moderna. E ainda que não seja uma disciplina natural, como o resto das artes.

Henri Cartier-Bresson dizia que "fotografar é pôr na mesma linha de visão a cabeça, o olho e o coração".

Carlos Miguel Cortés Calzado disse "encanta-me criar confusão entre meus seguidores, que observassem a foto, depois me leram, depois voltaram à foto, e não souberam com que ficar. Notar que essa união que me encantaria saber criar".
Uma boa imagem pode quase igualar em intensidade a linguagem verbal e converter-se em poesia visual. Não obstante, desde seu início foi rechaçada essa valoração que lhe deu à ideia, recordemos a opinião negativa de Baudelaire, em 1859, "com cada nova câmara fotográfica renasce a tecnofobia", enfim, ao poeta lhe é viável inventar a matéria prima de sua obra e o fotógrafo deve sair a buscá-la na eventualidade e pegá-la "in loco".


O poeta e o fotógrafo

De acordo com Mariano Cantoral, "o poeta, localizado em um refúgio solitário pode recriar instantes desde a distância, por havê-los vivido, visto, sonhado ou imaginado em um tempo pretérito, a imagem está armazenada em alguma parte do cérebro e só é questão de pôr em prática alguma técnica da mnemônica (da memória) e escrever, ou em todo caso, ativar sentimentos e aguçar sentidos.

Porém o poeta não vive só de recordações nem de enclausuramento, também abandona o refúgio, poetiza "in loco", sempre e quando possua um artefato pertinente com que fazê-lo: papel, mina, gravador, ou bem, a suficiente memória para depois escrever.

.O fotógrafo não possui essa vantagem, ele está sujeito à condição sine-qua-non de entrar em contato com o objeto de sua obra, detrás de sua lente, ativando o obturador, é uma conexão íntima e inevitável.

O poeta não necessariamente deve estabelecer esse vínculo direto, ainda que às vezes seja preciso, nem sempre é viável ou gratificante fazê-lo. às vezes só se trata de sentar-se frente à tela e abrir o processador de palavras ou sentar-se a verter palavras sobre uma nívea folha com intençoes de fazer poesia.

Enquanto à inversão em instrumentos de arte, o fotógrado, por requerer de mais técnica, deve dispensar muito mais recursos monetário que o poeta, uma câmara fotográfica (digital ou análoga), por exemplo, é  indubitavelmente mais custosa que um caderno ou uma resma de folhas, levando o caso ao extremo.

Alguém pensará, porém com os avanços tecnológicos, um poeta nestes dias escreve principalmente em um computador, porém regresso ao que já mencionei, o computador não é um instrumento essencial para escrever, senão uma modalidade contemporânea, como é a máquina fotográfica e seus gadgets (caso os tenha) para o fotógrafo.

O poeta trabalha com a palavra escrita, o fotógrafo com o visual da imagem, muitas vezes, segundo me contam amigos fotógrafos, ao ler um texto se vão gestando dentro de suas mentes, imagens, acaso porque têm desenvolvida por excelência, a estética visual, e talvez um verso possa impactar neles e motivá-los a realizar uma série fotográfica, isto é, transmutar um verso em imagem.

Por lógica formal deduzo que com os poetas ocorre igual, visto que de uma imagem podem emanar emoções e destas inferir versos.

Concebo sim a arte como um artefato dialético, em movimento e interação incessante, que possui distintos modos e meios, ramos e gêneros que podem ser letras, cores, pontos de luzes, movimentos, cenas, sons, etc, e sem temor de me equivocar, creio que uma obra de arte, manifestada com certa maneira e técnica, pode dar trela a derivações em diferentes modos; daí que um romance pode ser convertido num poema, um romance em filme, uma pintura em conto, uma foto em performance, um conto em arte dramática e assim sucessivamente em uma práxis eterna, quase matemática e muito parecida ao seu produto cartesiano.


Sumário

A casa da poesia tem muitas moradas, isto é, torna-se referência como uma expressão válida das múltiplas possibilidades poéticas de hoje, - como certamente ocorre neste caso - tema que abordamos nesta ocasião;
poesia e fotografia.

A natureza e o fim primordial da arte segue sendo um questionamento existencial, por isso então, preferimos abrir a entrevista com a seguinte frase: "A finalidade da arte é dar corpo à essência secreta das coisas, não o copiar a sua aparência" (Aristóteles)

Desde então a poesia quer renovar o milagre, sem que signifique esquecer os valiosos os seus valiosos ancestrais, importa o eu lírico, ainda que deva ir ao indispensável e ao urgente, não ao desabafo. Certamente, Juan Antonio Pellicer poetiza o cotidiano, as sombras do sonho, fotografia do real, a pureza das coisas. Possui uma consciência visual que se instala no concreto. Sustenta uma poesia fotográfica.

1. Sua poesia, simultaneamente, coexiste com as artes visuais, isto é, você situa poesia e fotografia como imagem, com esse mesmo olhar, para aproximá-la do leitor: Qual é a origem e porque você põe  ênfase com tanta maestria em ambas?

— Não saberia dizer a origem desta singular atração pela imagem e a palavra de forma conjunta, como única emoção. Suponho que desde a primeira infância já me deixava levar pelas sensações que percebia, tentando traduzi-las através das letras. Em diversas ocasiões é a imagem a que leva à letra e outras ao contrário, são estas as que buscam ou inventam a paisagem.

2. O que lhe oferece a poesia e a fotografia como retrato ou revelação?


— Poder transmitir emoções e sensações que a vida me presenteia em um momento concreto e pontual.


3. Esta simbiose entre poesia e fotografia, imagem e palavra, espreitam e submetem sua vontade? Quando começaram a ter transcendência para você?

— Diria que não me submetem, porém seria desonesto dizer que uma emoção não influa no ânimo de um criador. Sem dúvida o impacto emocional que pode chegar a transmitir uma imagem ou uma palavra às vezes "desarma" a vontade de uma pessoa. Desde muito jovem, quando com minha primeira câmara fotográfica na mão entendi que podia "capturar e manter" todos os momentos que via; posteriormente isso não foi suficiente, e além disso comecei a ter a necessidade de escrever sobre elas. Foi a partir de então, quando iniciei essa viagem convergente em meu interior donde Poesia e Fotografia para sempre caminhariam lado a lado, de mãos dadas.

4. Formula uma análise estilística ou estética em seu processo criativo?
— Em princípio não. Digamos que tudo começa após um voluntário ou inesperado "fluir". É difícil conter uma emoção, da mesma maneira que é inevitável correr com a máquina fotográfica em mãos apurando e perseguindo os últimos raios solares em um espetacular entardecer. Logo, evidentemente, chega o silencioso trabalho de estudo, análise e é aí donde, em ocasiões, trato de conseguir esse efeito visual e estético do ponto de vista que todo artista persegue para sua obra, isto é, não apenas que seja vista, mas que além disso seja entendida.


5. Que coisas chamam a sua atenção para que convivam com você essas imagens em suas fotografias?


— Tudo. Em certa ocasião e em resposta de uma pergunta similar disse que nada do que me rodeia me costuma resultar diferente. Às vezes, os estados anímicos impedem de ver ou envolver-se com cenas cotidianas: um olhar, o sorriso de um menino, um temporal, um resto de sol, etc. Em outras, resulta impossível não parar, olhar e sentir. É nesse momento quando me sinto vivo e parte ativa dessa vida.


6. Qual é o denominador comum em sua poesia?

— O ser humano. A vida. Os sonhos. A esperança... Isto é, tudo o que nos venha a sugerir um sentimento, uma emoção.

7. Há poesia na fotografia, pensando na sensibilidade de seus olhos que recolhem essa imagens? Existe harmonia entre o pensamento interno do criador e a estrutura do mundo exterior, ou você busca esse equilíbrio?

— Evidentemente que sim. A poesia é parte da vida, a fotografia, que não deixa de ser parte dessa vida feita de emoção, não é estranha à Poesia.
Trato de buscar o equilíbrio porque dele depende em muito a mensagem. É certo que existe uma fração entre os "dois mundos" nos que normalmente vive um criador, um artista. De um lado, seu mundo interior, baseado em uma verdade serena, única...; de outro, a desordem e a desestabilização do mundo exterior. É necessário conciliar ambos porque o artista é e deve ser "habitante vivo" - no sentido de poder captar e transmitir - de ambos.

8. A poesia tem uma intencionalidade, um transbordamento de emoções em torno a uma situação única que fecha seu ciclo dentro do texto. Temos aqui sinais poéticos, indícios poéticos, fios que flutuam ao vento... Como expressaria você o conceito de substância em poesia fotográfica?

— Como bem comentou, a Poesia Fotográfica, como a chama você, é uma tentativa de, pelo menos em meu caso, unir a voz do coração com uma parte da vida que é a sua imagem. Tentando em todo momento não perder a consciência e a realidade das duas artes. A Poesia deve ser uma grande verdade que nasce do coração e que segue ligada a outra grande verdade, como é o instante. Não cabem adulterações nem distorções. Quando o poeta fala da noite o leitor deve ver e sentir a escuridão.

9. A Literatura como atividade artística é criação com a palavra e, mediante ela, produtora de imagens com as que fazem a representação do mundo. Qual é sua finalidade, a ideia primogênita, mais além do que pensam outros poetas?


— Para mim, a literatura, da parte da Poesia é ou deve ser Pura Emoção. A Poesia não necessita, não tem necessidade nunca ao largo da história, a ajuda de uma imagem para ter vida própria. O Poeta tem sabido "construir" uma imagem com a palavra.
Ao mesmo tempo, não se pode negar a evolução do ser humano. Dizia Fray Luis de León algo assim como: "... o homem é filho de sua época...". E assim estamos. É inevitável e em certa parte imprescindível valer-se dos meios e recursos dos que a sociedade nos vai dotando para potencializar ou engrandecer uma obra. Por dizê-lo de maneira gráfica, poria um exemplo de um poema no qual se falou da Solidão onde fica expressada e manifestada perfeitamente entre seus versos; porém a imagem que acompanha tais versos reforçam e potencializam esse sentimento; a cena de uma praia deserta com pegadas na areia nos reafirmam esse conceito de solidão. Ainda que também possa ocorrer o contrário; isto é, uma paisagem por si pode ser capaz de transmitir uma emoção e esta ter uma caixa de ressonância como é a Poesia.

10. Quase toda a crítica literária hoje em dia parece coincidir no critério de que esta modalidade poética prove de uma expressividade que pretende dar dimensão estética à vida cotidiana, entendida como processo construtivo, pela apropriação de imagens, como partícipes de uma sequência cinematográfica, segundo manifesta Idalia Morejón. Quais temas você prioriza para usa sua máquina fotográfica?


— Evidentemente, a todo aquele que em um momento pontual capta a minha atenção. Não busco paisagens, nem o mar, nem um olhar...não. Vivo imerso em tudo isso e procuro ir com os olhos do coração bem abertos.

11. Que adjetivos ou metáforas ou um verso usaria você para definir a beleza da mulher, aquela que inspira admiração e deleite?

— Entendo que quando se refere à beleza, também o está fazendo no sentido profundo ou íntimo da expressão. Neste sentido tenho um Poema que precisamente descreve ou poderia descrever essa admiração pela beleza interior e também exterior de uma mulher. O Poema se chama "Y":

" E senti a amizade,
e junto a ela caminhei,
e cheguei junto a ti,
e em ti, me descobri.
.........."


12. Que gostaria de dizer — que não lhe perguntamos — aos leitores de PALAVRA FIANDEIRA, como troca de ideias, aproximando seu olhar ao foco da Revista?


— Como disse em seu discurso de solenidade do recebimento do Prêmio Nobel de Literatura (em 7 de Dezembro de 2010) o eminente e querido Mario Vargas Llosa, ficou em mim uma das citações contidas no discurso: 'O melhor que me aconteceu na vida, foi aprender a ler". Uma grande metáfora que todos deveríamos interiorizar porque é graças a essa leitura, que nos tem levado a essa paixão pelas Letras...


BIOGRAFIA



Juan A. pellicer (Jpellicer) nasce em 1957 em Cartagena, Espanha. Ao final dos anos 70 se transfere para Madrid, onde desenvolve seu trabalho profissional, o qual lhe permite a possibilidade de viajar, percorrendo grande parte da Espanha. Aproveita para impregnar-se de estilos, modos e maneiras distintas de ver a vida. Amante da natureza e a vida ao ar livre, durante muitos anos viveu e transmitiu intensamente essa atividade. Já por aquela época (anos 80) sabia que sua vocação chegaria da mão da Fotografia e da Poesia.

Após regressar à sua terra natal, começa uma nova etapa onde sente a necessidade de ir traduzindo sua forma de ver e entender a vida, através da Fotografia.Sente-se atraído pelas paisagens e cativado pelo mar. Lugar onde lhe resulta fácil perder-se. Conhecendo a fotografia digital finalmente se lança em busca do que chama de seu maior desafio, que não é outro que fazer da fotografia seu meio artístico de expressão , unindo a ele sua outra grande paixão, que é a escrita. A partir desse momento descobre que nele Fotografia e Poesia caminham agarradas de mãos dadas, pelo que " Fotografia é sensação, e sensação, fotografia".

É membro da Associação Nacional de Fotografia, com sede em Madrid, onde está exposta uma de suas coleções de Fotografia, precisamente a que leva por título: "Ruas de Madrid". É membro da Associação de Escritores da Região de Múrcia (AERMU).
A obra poética e fotográfica de Juan A. Pellicer (Jpellicer) é o resultado de sua inquietude e contínua rebeldia, a qual o leva a experimentar e buscar novas formas de transmitir emoções e sensações captadas através de sua máquina, valendo-se, em ocasiões, de tecnologia digital.

A Poesia é a forma que tem de transmitir as sensações e as emoções que emanam de seu sentimento. Como disse o escritor e crítico literário Ángel Brichs sobre a sua obra: "A linha cósmica, aplicada em uma estética muito categórica de traduzir os conflitos existenciais do Homem, e que subjaz - perdida - na contundente prosa poética de Pellicer, apura — gota a gota — uma lírica que busca, desesperadamente, uma razão para unir-se às imagens que a viram nascer, aqui envolvidas em ideogramas, que, à diferença do substrato imaginário, que engloba à poesia em geral, convergem em um "materialismo súbito" encarnado pela fotografia, com sua máxima: "Fotografia é sensação, e sensação, fotografia", este autor sempre tentou unir o que artistas como
Perejaume ou Toni Prat batizaram — o primeiro — e prosseguiram — o segundo — como poesia visual; no caso de Pellicer, com um pequeno acréscimo: a interação da poesia com a imagem, sendo, as duas, inseparáveis.

A obra poética de Jpellicer não pode ser entendida fora do Romantismo tal e qual lhe expressa o Engenheiro e Catedrático J. Conesa no prólogo que fez com motivo de uma de suas Exposições, concretamente a que levou por título: "Paisagens de meu interior". Dizia Conesa:
"Eu não sei o que busco eternamente na terra, no ar, no céu. Eu não sei o que busco, porém é algo que perdi não sei quando e que não encontro, ainda quando sonhe que invisível habita em tudo quanto toco e quanto vejo"

Sirvam estes versos do poema "Felicidade", de Rosália de Castro, para introduzir meu comentário sobre a obra exposta de J. Pellicer: Quando vi estes trabalhos, imediatamente me veio à mente o Romantismo; ao ver esta obra não pude deixar de nos românticos do XIX, e associá-la com o ideal romântico, no que o artista contempla a natureza como meio de expressão, quer senti-la plenamente, pertencer a ela, e com uma subjetividade muito marcante, descobrir a força da paixão, nestas escuras paisagens, quem sabe noturnas, porém que transmitem calma. Estamos diante de uma natureza sossegada, que traz paz, bem estar, porém não isenta de mistério e de espiritualidade. O artista se converte em um médium, que nos incita a contemplar a natureza escapando de toda prescrição intelectual, rebelando-se contra qualquer norma que lhe impeça de expressar seus próprios sentimentos e fazê-los prevalecer sobre a razão, manifestando livremente suas mais íntimas emoções: espírito idealista , melancolia, tristeza, quiças solidão. É o sentimento do homem só frente à natureza.



Em J. Pellicer, frente à figura do fotógrafo profissional, surge a do artista que trabalha por simples prazer estético, estimulado pela vontade de passar aos outros a emoção de um instante, ou a sensação reproduzida de uma fragmento da realidade, revelando seus sentimentos mais íntimos. Pellicer, rompendo com a fria perfeição trivial nos leva a contemplar novas formas de compromisso na imaginação e esplêndidas no contexto.


Creio, sinceramente , que as imagens que nos mostra o autor se convertem em sua melhor carta de apresentação. Só pediria serenidade na contemplação das mesmas. Com isso faríamos o melhor reconhecimento do autor e teríamos uma grande satisfação para nós mesmos.

Em distintos âmbitos começamos a conhecê-lo, coisa que não lhe desagrada, como: " O Poeta dos sorrisos azuis".




— Em Junho de 2008, apresentou sua primeira Exposição dem Cartagena. " Do olhar Pellicer" (Real Club de Regatas de Cartagena).

— Em Março de 2009, realizou sua Exposição " Paisagens de meu Interior", em San Vicente del Raspeig (Alicante)

— Em Abril de 2009 apresentou sua Exposição "Momentos", na Sala de Exposiciones del Centro Hispano Ecuatoriano en Madrid.


— Em Junho de 2009, participa com duas Fotografias, junto a outros artistas internacionais, em uma Exposição Conjunta sobre Ecologia e Mudança Climática em Buenos Aires (Argentina).

Todas as coleções e obras expostas vão acompanhadas de seus Poemas.

— Colabora com suas Poesias em Exposições de distintos Pintores.

— Participa com vários de seus poemas nas seguintes publicações:
* Poemas da casinha azul.
* Antologia Poética de Órbita Literária.
* Florilégio Poético Antologia de AERMU.
* Antologia Poética "Amanhã, ao despertar".
* Antologia Poética " Pinceladas de Histórias"


Participação no IV Festival Palavra no Mundo, Poetas pela Paz nas instalações do Mtro. Zapata, no México, D.F. com a Fotografia "Gota de Água", e o Poema "Y".
— Dois de seus poemas foram selecionados para acompanhar a obra da pintora Gallega Sara Garrote (Chuca) na Exposição Sacobeo 2010, que tem percorrido as cidades de Lisboa, Galícia, Paris e Frankfurt.

— Colabora mensalmente em jornal regional com um Poema acompanhado de uma Foto.

— Recentemente ( Abril 2010) foi convidado a tomar parte de uma expedição pelo Grande Atlas Marroqui, onde teve a sorte de conhecer a outras formas de vida e costumes, como são as aldeias nômades bereberes.

Seus projetos mais imediatos são:

— Publicação de seu primeiro Livro de Poesia e Fotografia com o título: "Sonhos da Alma".
— Edição e Publicação de: "Areia, Mar e Vento. Versos em bordas de emoção". Antologia Hispano-Italiana, junto aos artistas Marino Rossetti y Reo Revilla.
— Edição e Publicação de seu segundo livro de Poesia e Fotografia em solitário: "Versos de Azul. Poemas junto ao mar e um soneto de emoção".


— Foi convidado junto com outros artistas nacionais a participar em uma Exposição Coletiva que terá lugar no próximo Abril em Oporto (Oporto), na qual mostrará dois Poemas junto a suas duas Fotos correspondentes.
— Continua colaborando com distintos artistas os quais solicitam seus trabalhos, ora fornecendo Fotografias para capas de livros, ora fornecendo Poemas para integrá-los com as pinturas.
— Recentemente, criou um espaço virtual chamado "Os 4 Muros de Jpellicer", que gira em torno da Arte e a Cultura, onde são citados diversos Artistas nacionais e internacionais de todas as disciplinas: fotografia, poesia, pintura, escultura, música, cine, narrativa, etc

Juan A. Pellicer se encontra em um momento vital ótimo para afrontar novos desafios artísticos dentro do mundo da Fotografia e a Poesia, desafios que lhe permitam seguir crescendo como pessoa e como profissional.
Seu Sonho: poder triunfar no mundo da Fotografia e a Poesia.
Sua Meta: desfrutar enquanto o consegue.
Seu Fracasso: não o haver tentado.
                                                        *


E


... E senti a amizade,
e junto a ela caminhei,
e cheguei junto a ti,
e em ti me descobri.
E vivendo e descobrindo,
e do amor bebendo,
e amando saboreando,
e saboreando morrendo.
E amar para viver,
e viver para gozar,
e gozar para sentir,
e sentir para voar,
e voar para chegar,
e chegar para beijar,
e beijar para esquecer,
e esquecer para acalmar,
esta tristeza minha, que sinto aqui,
em minha alma, ontem, hoje, amanhã...
e cada dia.


LETRAS DE AMOR


Com palavras escapadas dos lábios daquele que ama,
como beijos presenteado daquele que espera outro minuto,
com o olhar do coração que chama,
com esse sorriso cúmplice, amante e verdadeiro,
com a certeza do amor vestido de quimera.
Aqui te deixo meus dias,
aqui todos os meus momentos;
aqui te rezei minhas pregações,
Aqui te vivo, aqui te sinto,
e deixo neste amargo momento,
um a um gravados todos os meus lamentos,
letras vividas, sonhadas e acreditadas,
letras inventadas em minha alma,
desenhadas em teu corpo,
esquecidas em tua noite e perdidas para sempre,
letras que nunca teus olhos viram,
letras de amor que do coração saíram.
Letras de amor,
presenteadas à noite,
silêncios desenhados de dor,
refletindo em cada estrela uma cor,
e em cada verso um instante,
e a cada instante...
uma nova palavra de amor.



MAR CALADO



Lá onde o mar busca o infinito,
onde o dia se dá por vencido
e a paz se sente verdadeira,
minhas lembranças vou pendurando uma após outra,
andarilhas como sem donos,
a brisa as leva e de ternura as consola,
e o mar, vestido com o traje do adeus,
de sua mão, vão deixando uma estrela.
Mar calado que me fala em silêncio,
em teus céus azuis pintados de amarelos
desenhas as palavras das tardes de verão
que queriam sair e voar e à sua costa chegar.
Neste instante de paz, cálido presente,
as palavras se rendem à magia do silêncio,
inventando sussurros que me trazem as ondas,
que chegam murmurando meiguices buscando sua morte,
entre lágrimas perdidas de pérolas confundidas.
Mar calado
cúmplice e testemunha de tantos lamentos
ribalta requintada de tão falsa quimera
onde um coração na noite sonhava e buscava,
sem querer compreender que o novo dia,
para sempre e de teu silêncio acompanhado,
em teu horizonte, real como minha pena, desaparecia.

VERSOS PLENOS DE VERDADE




"Palavras que nunca foram e que nunca chegaram,
versos agonizantes, que em minha mão, covarde,
também calados, oprimidos, todos foram silenciados;
versos que de esperar choraram manhãs vestidas de cor,
e de sonhar sonharam alegrias loucas como de beijos de amor.
Palavras que perdidas entre bosques inventados.
até por buscar, buscavam em silêncios, abraços tatuados;
palavras que perderam a vida, e a vida emudecida ficou,
palavras que sem vida chegaram,
palavras que o coração, jamais escutou.
E neste momento de silêncio de tudo,
de papel vazio e branco de nada,
de tristeza grande e forte de medo,
de incerta manhã de verdade,
neste momento de tanta adversidade,
olho minha mão e ela, como obedecendo outra vez mais,
me deixa este verso... tão pleno de verdade"


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ROCÍO L' AMAR
A escritora Rocío L'Amar é correspondente e colaboradora de 
PALAVRA FIANDEIRA.
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A entrevista com J. Pellicer foi traduzida do Espanhol por Marciano Vasques, escritor fundador de PALAVRA FIANDEIRA.
A entrevista no original pode ser lida em SALÓN DE ENTREVISTAS.
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Revista PALAVRA FIANDEIRA - Fundada por Marciano Vasques