EDITORIAL

PALAVRA FIANDEIRA é um espaço essencialmente democrático, de liberdade de expressão, onde transitam diversas linguagens e diversos olhares, múltiplos olhares, um plural de opiniões e de dizeres. Aqui a palavra é um pássaro sem fronteiras. Aqui busca-se a difusão da poesia, da literatura e da arte, e a exposição do pensamento contemporâneo em suas diversas manifestações.
Embora obviamente não concorde necessariamente com todas as opiniões emitidas em suas edições, PALAVRA FIANDEIRA afirma-se como um espaço na blogosfera onde a palavra é privilegiada.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

PALAVRA FIANDEIRA 26


PALAVRA FIANDEIRA
REVISTA DE LITERATURA
ANO 1 - Nº 26 - 21/ABRIL/2010


NESTA EDIÇÃO:

MICHELLE BEHAR
__________________________________________________________

@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@@

MARCIANO VASQUES ENTREVISTA:


1. Quem é Michelle Behar?



Uma apresentação básica que aparece nos meus sites:
Michelle Behar, artista plástica, nascida na Guatemala em 1955. Naturalizou-se brasileira e mora em Curitiba, Paraná. Atualmente trabalha como Gravadora, Desenhista, Pintora e Ilustração Free-Lance. Ministrou cursos de extensão de gravura na Universidade Federal do Paraná e dá cursos particulares de Pintura em Computador. Desenvolve ilustrações para livros, pinturas, gravuras em linóleo e artes plásticas digitais.

2. - Michelle, você é guatemalteca, e vive em Curitiba. Quando veio ao Brasil e o que a levou a tomar a decisão de aqui viver? Pode nos contar essa história?

Com 18 anos sai da minha terra natal, para ir morar na Suíça com meu pai que foi transferido para a Organização Mundial da Saúde. Foi lá que conheci um brasileiro, paulista, músico com quem casei e que veio a ser o pai dos meus filhos. Não era possível ficar morando na Suíça já casados, por isso vim com ele para o Brasil, para São Paulo, inicialmente durante dois anos. Mas ele foi transferido para trabalhar em Curitiba, e ao chegar aqui, eu pensei: é aqui que quero morar o resto da minha vida. Eu tinha 23 anos à época.

3. Andou em Genebra, na Suíça, poderia falar dessas suas andanças?

Estando em Genebra tive a oportunidade de freqüentar o curso de Belas Artes. Fiz cursos extracurriculares de desenho e escultura com modelo nu. Mas a principal oportunidade que tive morando lá na Europa foi poder conhecer as principais cidades e museus europeus, o que é uma experiência única, culturalmente falando.

4. Sob orientação de Eva Funari frequentou um atelier, um curso. Conte-nos essa passagem em sua vida.

Morando já em São Paulo procurei algum lugar onde poderia continuar meu trabalho artístico. E foi assim que conheci o Atelier Lassar Segal. Local deixado pelo artista para ajudar jovens artistas a ter um local para desenvolver seu trabalho utilizando as prensas de gravura e os espaços que eram o atelier dele. Foi lá que conheci e fiz amizade com Eva Furnari. Isto foi mais ou menos em 1977. Na época ela ainda não trabalhava como ilustradora, mas vendo o maravilhoso desenho dela, trocamos muitas idéias sobre ela se encaminhar para essa área, e preparar um portfólio para apresentar às editoras.

Ela seguiu esse caminho, eu segui o meu como gravadora, mudando para Curitiba e procurando então o atelier da Lais Peretti, que tinha um atelier de litografia particular. Foi com ela que, mais tarde, o grupo todo foi trabalhar no Solar do Barão, da Fundação Cultural de Curitiba.

5. Já participou de exposições em San Salvador, em Havana - Cuba. Considera que para um artista as exposições individuais ou coletivas sejam relevantes?
Um artista sempre quer que sua arte chegue ao público de uma forma que sensibilize as pessoas. E só pode acontecer isso se o trabalho é mostrado em exposições, sejam coletivas o individuais. Mas um artista nunca é um bom comerciante, e ele deveria poder contar com um marchand para fazer essa parte de divulgação e venda do trabalho. Ocorre que, infelizmente no Brasil, a arte ainda não tem seu devido valor para que o artista possa ser só artista.

6. Já recebeu algum prêmio pela sua arte?

Ainda na Guatemala recebi um premio importante de cartazes, com o tema dos 150 anos da independência da Guatemala. O que esse premio marcou em mim foi que além da quantia em dinheiro que veio, ganhava 100 copias da reprodução do meu cartaz. Tive a oportunidade de visitar o atelier litográfico que estava fazendo isso e ver como era feita a separação de cores e as placas litográficas comerciais. Foi uma experiência que marcou pelo encantamento de ver o trabalho reproduzido em múltiplos. Acho que isso que me deu o gosto pela gravura e depois pela ilustração também.

7. Tem alguma arte de sua produção  em acervo?

Tenho uma obra de gravura que foi doada para o Museu Colméia em Lages, que iniciava sua coleção na época. Nem sei se ainda existe esse museu por lá.
Uma das minhas gravuras de litografia coloridas passou a fazer parte do acervo do Museu da Gravura da Fundação Cultural de Curitiba após ter dado um curso lá no Solar do Barão.
A mais importante, é a litografia que passou a fazer parte do acervo do Walt Disney. Eu deixei algumas obras para vender numa galeria da Guatemala. E foi la que o filho do Walt Disney viu e comprou uma gravura minha para fazer parte do acervo deixado pelo pai dele.

8. Em tempos de mídia digital, como vê a importância dos museus para a cultura?

Poder ver e apreciar uma obra de arte, ter acesso a ela por mídia digital, é sempre uma enorme vantagem. Mas a emoção de poder visitar um museu e ver obras de uma forma física, sejam elas pinturas convencionais, gravuras, fotografias e pinturas por computador impressas, sempre será uma experiência diferente e mexe mais com a emoção. E para mim arte é isso, mexer com os sentimentos.

9. E o livro, o que poderia nos dizer? Ele sobreviverá na sua forma tradicional?

Existem muitos tipos de livros. As enciclopédias, por exemplo, são livros que já morreram, com o melhor sistema de busca e informação que o homem já viu no Google. Os didáticos estão perdendo para as apostilas, o que eu acho uma pena. Tem livros que são só para se  ler uma única vez, como entretenimento, esses podem ser lidos digitalmente num Palm ou celular. Agora, existem os livros que são uma jóia, pelas suas ilustrações ou fotografias, acompanhados de informação ou historia. Esses em minha opinião, nunca vão morrer.

10. Ilustrou o livro A CIDADE DAS CANTIGAS, que agora é também uma peça de teatro, um musical aprovado pelo Ministério da Cultura. Conte-nos, por favor, essa experiência de ver sua arte num livro, que depois também é transformado numa peça teatral.

Página do livro "A Cidade das Cantigas"
O maior desafio na ilustração de "A Cidade das Cantigas" foi representar nele a neta do autor e a minha filha, como as meninas que são as personagens do livro. E eu adorei poder fazer isso, e brincar com o imaginário das canções infantis.

11. Você acaba de lançar um livro, que é o seu primeiro. Fale, por gentileza, desse livro. É um livro com suas obras de arte? 

Michelle Behar autografando no lançamento do seu livro

Este livro Zoomorfosis surgiu num processo contrario ao normal de um livro ilustrado. Pois foram as obras de arte já prontas que sugeriram a historinha que é relatada no livro. Foi um processo longo de mais de um ano de criação de obras de gravura originais. Depois veio a criação da historia que eu nunca tinha tentado me expressar na escrita, a tradução para o espanhol, minha língua natal. E depois todo o processo de diagramação, edição, registro, ficha catalográfica, enfim, o processo completo de criação de um livro que foi uma experiência muito interessante.

12. Pergunta padrão em PALAVRA FIANDEIRA: O que é para Michelle Behar a felicidade?

Para a felicidade eu tenho um pequeno poema escrito que descreve bem o que penso:

De dentro para fora
Procurando andava um dia
onde achar a alegria;
a procurei de norte a sul
do Pacifico até a Oceania.

E também a felicidade
que nem no amor eu a via,
pensei que alguém a possuía
ou lá longe a escondia.


Mas o que eu não sabia
e que em nenhum lugar estaria.
Pois a felicidade e a alegria
estão onde menos pensaria.


Com muita surpresa eu vi
que a chave eu já tinha,
e a fechadura, quem diria!
só de dentro para fora abria.

15/10/08
Michelle Behar

E olhando de dentro para fora cheguei a conclusão que a felicidade maior consiste em poder trabalhar no que mais gostamos, e fazer isso com muito amor.

13. Atualmente você aprecia mais a arte digital, ou ainda gosta de desenhar no papel?


A arte de Michelle Behar


A arte digital é uma ferramenta muito poderosa de criação. Da muita liberdade de criar e refazer quando é necessário. A utilizo muito na ilustração, pois sempre são necessárias mudanças que digitalmente são mais fácil de fazer sem ter que desenhar tudo de novo. Mas também utilizo essa arte digital para fazer projetos de pinturas e gravuras que depois eu vou tornar realidade física no papel ou na tela.

14. Como vê a produção de Literatura Infantil no Brasil? Poderia citar alguns autores, escritores, e também ilustradores, cujo trabalho você acompanha?

Eu acho que a literatura infantil no Brasil tem excelentes autores e ilustradores, apesar de nem sempre serem bem remunerados, como é o caso no exterior, quando um ilustrador pode viver bem com o que ganha ao ilustrar um livro por ano. E isso permite a ele o tempo e dedicação de fazer um trabalho muito caprichado.
Acompanho sempre o trabalho da Eva Furnari com quem ainda mantenho amizade, e da Marcia Széliga como ilustradora, cujo trabalho eu admiro. Como autores, eu gosto muito do jeito que o Marciano Vasques escreve, e também da Liana Leão. 


 Marcia Széliga, escritora e ilustradora de Livros infantis

15. É sócia, membro de alguma Associação, alguma entidade dos ilustradores?

Freqüento as reuniões do Costelão Ilustrado, onde um grupo de ilustradores de Curitiba se reúne uma vez por mês para beber, comer, conversar, trocar experiências e desenhar nos papeis Kraft que forram as mesas. Esses papeis logo farão parte de uma exposição muito interessante e diferente.

16. Você atua em diversas formas de produzir arte, passando pelo desenho digital e outros, como o desenho vetorial, falando nisso: o que é um desenho vetorial?

Existem duas formas básicas de criar imagens no computador, as de bitmap e as vetoriais. A diferença principal consiste na forma como o computador vai lembrar dessas imagens. O bitmap é registrada num quadro de coordenadas x e y, onde cada pontinho que compõe a imagem tem um valor de cor, saturação e luminosidade. Isto permite criar de uma forma mais natural para o artista, com um desenho mais livre, mas não permite aumentar muito a imagem do tamanho que foi criada sem perder qualidade. É o sistema utilizado também para fotos.
Já as vetoriais são lembradas pelo computador por formulas matemáticas parabólicas. Mas para isso, tem que ser criadas em programas próprios, e compor a imagem como um quebra-cabeça de linhas e preenchimentos que se somam para formar a imagem. Isto permite ao computador lembrar só as formulas e cores, podendo fazer essa imagem ficar em qualquer tamanho sem perder qualidade.

17. Está no Twitter? O que significa para você essa onda atual de alguém ter, por exemplo, dois mil e até vinte mil seguidores, e alguém ter no mundo virtual centenas e centenas de amigos?

Estou no Twitter sim, mas não sigo tanto como vejo que meus filhos o fazem. Estou também no Facebook e no Orkut, no GTalk e no MSN. Comecei nessas redes principalmente para acompanhar atividades da família que esta longe, mas sempre vão aparecendo amizades novas em cada lugar. Acho que os familiares e as amizades ficam mais perto dessa forma. Pois considero que a amizade é algo que sempre tem que ser cultivado, e poder ter um contato e resposta imediata ajuda muito. As amizades, mesmo sendo virtuais, sem nunca ter conhecido pessoalmente, são muito reais quando se encontra uma afinidade boa. Tenho amigos na internet de faz mais de 15 anos, que nunca vi pessoalmente,  mas que acompanho a vida deles sempre com carinho. Tenho amigos ate na Islândia!

18. Acompanha a Arte Contemporânea? Muitos não gostam, alguns criticam, outros não entendem, há quem diga que ela privilegia a estética do feio. Que comentário faria a respeito?

Para mim a arte é sentimento, e se uma arte não consegue mexer com esse sentimento, não adianta. Mas esse sentimento nem sempre precisa ser bom, ai depende de como o expectador se identifica, pois tem gostos para tudo. Eu pessoalmente aprecio o que me passa uma sensação boa e bela. E dentro disso pode ser algo abstrato ou figurativo. Mas acho que o figurativo, por ser mais facilmente sentido, esta voltando a ter força no meio das artes contemporâneas.

19. Certamente é uma considerável leitora. Poderia nos citar pelo menos um livro que tenha lido e que realmente possa ter influenciado a sua vida?

Eu lembro que os livros do Richard Bach, principalmente o "Fernão Capelo Gaivota", mexeram e influenciaram muito na minha juventude. Foi onde vi que uma historia pode voar muito mais longe na imaginação do que as formas convencionais de novelas que seguem uma linha dentro da realidade, mesmo sendo ficção.

20. Você fez um desenho que atiçou a curiosidades de muitos, que é o "Mickey Feio". O que quis transmitir com esse trabalho?




O "Mickey Feio" foi só uma forma de mostrar aos ilustradores participantes esse jeito de ilustrar com estilo de gravura, que fica muito adequado para historias de medo, que a garotada hoje em dia curte muito.

21. Fale de algo de nossa época que realmente a deixa muito triste.

Eu acho que não tem nada na nossa época que não tenha tido em outras anteriores, que são as atitudes de desrespeito de algumas pessoas que não conseguem viver dentro de um principio básico de ética moral onde amar ao próximo como a si mesmo é a base. Mas o homem tem evoluído muito lentamente desde que esse principio foi estabelecido. Tenho fé que um dia chegamos lá, por isso não fico triste. Ao conseguir isso, o respeito será total, tanto pelo homem como pela natureza, pois somos todos parte de uma coisa só, o Universo.

22. Quando, em que momento em sua vida, desabrochou, ou seja, surgiu a Michelle artista plástica? Em que momento a arte entrou em sua vida?

A arte não surgiu na minha vida, a arte nasceu comigo, e desde que tenho consciência, eu tenho pintado e desenhado sempre, até antes de aprender a segurar um lápis, eu já pintava com pinturas de dedo. Sempre tive certeza que era isso que eu queria fazer na minha vida. Como aplicar isso para poder viver é que foi aparecendo aos poucos, primeiro como gravadora e depois como ilustradora e professora também, pois gosto muito de poder ensinar o que sei.

23. Como vê a produção cinematográfica para o público infantil?

Acho que a produção cinematográfica desde que surgiu, encanta tanto adultos quanto crianças. É um mundo que eu adoro, e onde tem possibilidades infinitas de expressão e criação também.

24. Deixe a sua mensagem final para os leitores de PALAVRA FIANDEIRA.

Minha mensagem final para os leitores seria meu conselho de viver a vida intensamente. Viver cada momento como algo único e dedicar a vida ao que se gosta com amor. Assim encontramos uma paz e felicidade que dá sentido a nossa vida. 

 __________________________________________

Entrevista realizada por Marciano Vasques
Marciano Vasques é escritor

5 comentários:

  1. Michele, que história, que respostas, que desenhos... parabéns!!!
    Ganhou o milionésimo fã com certeza!

    ResponderExcluir
  2. Soy hermana de Michelle y tambien soy su fan numero 1! Desde que la conozco siempre he admirado su creatividad, su forma de expresarse y su dedicacion a lo que cree.
    Asi cabal es ella, tal y como aparece y responde en esta entrevista.
    Adelante, hermanita!

    ResponderExcluir
  3. Soy hermana de Michelle y tambien soy su fan numero 1! Desde que la conozco siempre he admirado su creatividad, su forma de expresarse y su dedicacion a lo que cree.
    Asi cabal es ella, tal y como aparece y responde en esta entrevista.
    Adelante, hermanita!

    ResponderExcluir
  4. Mi Amiga del alma, mi amiga-mana!
    Cada paso es eso un paso a ser conocida tu obra, tus expresiones y mas aun, esa alma que te habita!
    Felicidades!

    ResponderExcluir
  5. Muito legal tua entrevista, mãe!! Beijos!!

    ResponderExcluir