EDITORIAL

PALAVRA FIANDEIRA é um espaço essencialmente democrático, de liberdade de expressão, onde transitam diversas linguagens e diversos olhares, múltiplos olhares, um plural de opiniões e de dizeres. Aqui a palavra é um pássaro sem fronteiras. Aqui busca-se a difusão da poesia, da literatura e da arte, e a exposição do pensamento contemporâneo em suas diversas manifestações.
Embora obviamente não concorde necessariamente com todas as opiniões emitidas em suas edições, PALAVRA FIANDEIRA afirma-se como um espaço na blogosfera onde a palavra é privilegiada.

sábado, 6 de outubro de 2012

PALAVRA FIANDEIRA 86




PALAVRA FIANDEIRA

REVISTA LITERÁRIA
Revista Digital de Artes e Literatura
ANO 3 - Nº 86 — 06/10/2012

NESTA EDIÇÃO:


PAULA LARANJEIRA





1.Quem é Paula Laranjeira?


Professora, blogueira, e como disse um amigo, a entrevistada. Para os outros sou de fácil definição (creio que nem Pessoa conseguiu ser tantos “eus”), porém, ainda estou tentando saber-me neste mundo, pois quando achava que me sabia em todos os cantos e recantos, me vi confusa, sentada no meio de um labirinto, a procura sempre, do fio de Ariadne.



2.Desenvolve um intenso trabalho de resgate e preservação da cultura autêntica em seus retalhos poéticos, divulgando texto de Ariano Suassuna, Luiz Gonzaga, a melhor poesia e ainda escreve sobre a Literatura Infantil. Como vê o esfarelamento cultural tão apreciado e divulgado pelas mídias?


Quando se sabe que por trás de tudo há uma intencionalidade baseada no interesse econômico, e mais que isso, na necessidade de poder absoluto de alguns indivíduos, fica fácil desconfiar de tudo e todos. Tenho visto há algum tempo na televisão e nas rádios a propagação de valores que têm mudado profundamente a sociedade e a “solidez” cultural. Primeiro há uma severa mudança nos valores familiares, onde tudo é permitido e a única lei é o “sim”. Posteriormente há o enfraquecimento qualitativo na educação, fator que nos torna mais maleáveis. E por fim, o “tiro de misericórdia”, o esfarelamento da cultura. Aí pergunta-se: o que sobra? Bem, sobram indivíduos sem valores, sem conhecimento e condição de interpretação e análise dos fatos, além de desprovidos de qualquer conhecimento cultural que o fortaleça enquanto coletividade. E sem nenhum bem simbólico que lhe pertença, “essa” gente, na qual também me incluo, facilmente se deixa manipular, se torna consumidor ativo e desenfreado. O que gera lucros e poder para uma pequena minoria.

Ou seja, esse esfarelamento cultural é algo necessário e parte de um processo que aniquilará de vez o espírito dialético tão necessário a uma sociedade que prima pela democracia e igualdade.

3.Que comentário faria sobre a decadência nas artes, na música, sobretudo a música dirigida aos jovens, a forma de arte que atinge mais diretamente a juventude?


A contra gosto, já ouvi muita coisa: axé, forró, funk, sertanejo, pagode e quase sempre com letras vazias, mensagens estereotipadas, possibilitando a aquisição de valores errôneos, especialmente no que se refere a relacionamento amoroso e sexo e às mulheres. Creio que a música tenha contribuído, em grande parte, para a formação de muitos jovens, por tal, a qualidade da música influenciará de forma positiva ou negativa este ouvinte. Toda geração lida com estas duas possibilidades musicais: a vulgar e a mais refinada, mas penso que nunca antes tenha sido tão direcionada ao esvaziamento intelectual e reflexivo como agora. Porém, também se percebe que muitos destes ouvintes têm fugido desse tipo de música, buscando em autores “das antigas” um repertório mais significativo, o que tem provocado muitas releituras e regravações de músicas do século XX, por exemplo.


4.Nos fale, por gentileza, sobre Pesponteando: Retalhos Literários.



Meu blog! Meu lugar no mundo. Neste dezembro completa dois anos. Nasceu objetivando aniquilar meu vazio. Eu tinha terminado a faculdade e sem absolutamente nada para fazer, apenas alguns livros, quatro anos de estudo e um computador. Tive medo de enlouquecer diante da possibilidade do “nada”. Aí o pari num dezembro chuvoso, pois aqui ainda chove. É um menino ingênuo que muda seu discurso a cada dia, pois todo amanhecer traz novos conhecimentos, e consequentemente, maturidade, reflexão, crítica e autocrítica, o que se reflete em mudança constante, ou melhor, metamorfose. O Pesponteando tem de tudo um pouco, sempre relacionando à arte e cultura. Neste meu pedaço de chão virtual vou tecendo alguns tecidos em meu tear, vou juntando uns retalhos a outros, cozendo à mão ou à maquina novas peças, bordando em certos tecidos bem ao modo da minha mãe, só que meu tecido é o texto, minhas linhas são as palavras, minhas agulhas são ora a caneta ora o teclado.


5.É formada em letras e atua na Educação, no Ensino Médio. Como vê a produção atual de Poesia com o advento da internet como um espaço democrático e infinito? Tem poeta demais no mundo?


Talvez tenha poetas de menos. Com o nascimento do romance a poesia perdeu espaço, já que os leitores, provavelmente pela formação, acabam encontrando mais “facilidades” de compreensão do conteúdo na prosa. Já o leitor deste gênero, a poesia, muitas vezes pauta suas leituras apenas em produções contemporâneas, se afastando de poetas e produções de outros tempos. Além disso, os produtores ou pretensos produtores de poesia, em grande parte, são leitores de poucos poetas e gêneros, o que acaba refletindo em suas produções certa “pobreza”. Os textos são quase circulares. É por isso que penso que temos poetas de menos, há muita gente escrevendo, mas poucos com grandiosidade. Porém, e isso é quase uma contradição ao que acabo de dizer, tenho observado que a internet além de revelar muita poeira embaixo do tapete, também tem revelado pó de ouro. Tem muita gente boa, com boa poesia se mostrando nas janelas da rede, fato que torna a internet uma ferramenta positiva e democrática não só por trazer os tesouros desconhecidos, mas por possibilitar o acesso a livros, bibliotecas, textos raros, entre outros, a quem busca fomentar e enriquecer o intelecto.

6.Mário Quintana, Manuel Bandeira, Cecília Meireles, Fernando Pessoa, Manoel de Barros, Castro Alves, Sidónio Muralha, Drummond... A poesia ainda é necessária no mundo atual, tão midiático e dominado pelo imediatismo consumista desenfreado?


Certamente sim, pois além de ser freio, ela é luz. E quem não precisa da luz? O que noto é que não há um poeta ou um leitor deste e de outros gêneros literários que não seja um portador ativo de consciência. E o portador da consciência é avesso ao imediatismo e ao consumismo. Falando em consumismo, é interessante colocar como as pessoas buscam no ato de consumir freneticamente o lugar/estar da felicidade, é onde se encontra o prazer. Porém, há quem consiga o mesmo prazer em um livro. Desta forma percebemos que estamos estimulando hábitos errados. Seria revolucionário a mídia propagar o consumo de livros, mas livros com L maiúsculo. Porém isso não acontecerá, pois as TVs perderão seus telespectadores. E outros meios midiáticos como algumas revistas, perderão seus leitores.


7.Como vê a blogosfera? Atribui ao blog importância no resgate de valores artísticos?


Quando comecei a perambular pelos blogs, confesso que fiquei assustada. Era/é tanta coisa que às vezes tentando me achar, acabava me perdendo para logo em seguida me achar novamente. A blogosfera, termo ainda novo para mim, é um espaço de todos, de todas as manifestações, de todas as artes. Há algum tempo atrás se fazia pesquisa em livros, porém eram poucos e com informações limitadas, hoje há uma janela escancarada para o mundo, infinitas possibilidades, especialmente no que se refere às artes. Tomo como exemplo a Literatura de cordel, antes restrita ao nordeste, hoje está ao acesso de todos na blogosfera. A internet traz essa maravilha: o descortinar daquilo que era escondido, acessível a poucos. Num clique a democracia se instala. Às vezes, alguém cria um blog para culinária, mas acaba visitando e sendo visitado por blogs/blogueiros que tratam de poesia, contos, musica, dança, artes plásticas...e o que era desconhecido de alguns vai se espalhando. Claro que nem tudo possibilita o resgate de valores artísticos, há espaços que acabam atrapalhando com informações equivocadas, mas no geral tem muita coisa boa.

Com o escritor Marco Haurélio
8.Seu blog está recheado de pinturas que abordam bordadeiras e costureiras. Como é para você esse simbolismo? Qual o significado dele em sua vida?


Não me lembro ao certo da primeira vez que vi alguém com tecido e agulha. Mas este ato sempre movimentou alguma coisa em mim. Na condição de observadora do sujeito que movimenta os elementos do universo têxtil, sou capaz de recitar uma poesia concreta de imagens que trago desde a infância. Me lembro de tia Eridalva com o seu tear, a roda de fiar, o fuso, o descaroçador e o algodão. Era o básico para a mágica da construção do tecido.
Também tenho a minha mãe e sua velha máquina de costura. Muitas vezes sentava-se à máquina de costura como a Clarice Líspector à máquina de escrever, construindo no lugar de textos, colchas almofadas, tapetes: uma espécie de texto feito com tecidos. Eu adorava ficar olhando, e ainda o faço algumas vezes, quando ela faz consertos em alguma peça de roupa ou outra coisa.
Lembro - me também de várias vizinhas costureiras. Sempre gostei de frequentar suas casas, ficar ao lado da máquina observando o vai e vem da agulha, a linha, a tesoura e a nova peça que surgia. Era tudo tão lindo!
Já na condição de sujeito que trabalha com o tecido tenho certa experiência. Primeiro com as roupas de bonecas, ainda me lembro do gosto de costurar embaixo da mesa num dia chuvoso algumas roupas para as escassas bonecas. Depois, como não conseguia manipular a máquina, aprendi a bordar com pontos diferenciados: cruz, corrente, cheio, etc. E pela necessidade de reformar algumas roupas também bordei com miçangas e lantejoulas.
Mas foi na faculdade que veio o grande encontro: a costura e o texto. A comparação do texto com o tecido. Não me recordo o autor que faz essa analogia, mas foi/é algo que fica sempre se movendo em mim enquanto escrevo.
As costureiras, as bordadeiras, sempre estiveram presentes em minha vida, mas agora a costura é feita com as letras, as frases, e o papel em branco dá lugar a esta nova tessitura. Me encontrei... e tento ser uma tecelã das palavras, por isso as imagens no blog e todo o contexto sempre chamando a atenção para este universo.

Obra de Vicente Romero
9.Aprecia literatura Infantil, certamente. Ela, essa forma literária, acredita que seja apenas para crianças?


Por algum tempo me limitei a este achismo: literatura infantil é coisa de criança. Mas tenho revisto muitos conceitos e este é um. Estudei um pouco de literatura infantil, e ao fazer isso entrei em contato com alguns textos, busquei os que havia lido na infância e adolescência. Acabei reconstruindo o gosto por esta especificidade literária, aguçando o olhar para várias questões antes ignorada em face ao preconceito etário e, simplesmente, me encantando. Vira e mexe aparece algum livro infantil aqui em casa, e tenho alguns na prateleira. Pena que o livro infantil esteja sendo substituído pelo filme com histórias infantis. A grande maioria dos pais compra DVD para os filhos quando poderia estar comprando livros.
Autoria da foto: Paula Laranjeira
10.Há um livro que possa citar que tenha influenciado de alguma forma na sua vida ou maneira de pensar?


Passei por momentos difíceis: hospitais, cadeira de rodas, desistência dos estudos, etc. E num destes períodos passei a ver muita TV, era uma forma ocupar a mente e esvaziá-la ao mesmo tempo, até que uma prima insistiu para que eu gastasse meu tempo com leituras. Pois bem, ela me emprestou alguns livros e entre eles estava Meu pé de laranja lima. Foi a grande descoberta da minha vida: o livro era vivo e podia mexer comigo, fazer rir ou chorar, pensar. Foi a porta de entrada para outras leituras: por isso tem muita importância em minha vida, já que a leitura possibilitou a descoberta de outros mundos. Tem uma frase do Mário Quintana, que gosto muito. Diz assim: “Livros não mudam o mundo, quem muda o mundo são as pessoas. Os livros mudam as pessoas”. Pois é, o livro fez grande mudança em minha vida e eu quero que esta mudança se estenda ao mundo.
Claro que existem outros livros que contribuíram para a mudança de alguns pensamentos/partes de mim de maneira mais objetiva, mas tudo começou com este, já que tudo que li antes ficou restrito ao papel.

11.Há um grupo de poetas de qualquer tempo e idioma, que para você seja representativo da poesia mais autêntica e transformadora de corações e consciências? Poderia citar alguns nomes?


Confesso que me dou mais à prosa que a poesia. Mas gosto dos poetas que surgiram com e a partir do Modernismo. A liberdade de estilo, formas e conteúdo deu mais chances para quem escrevia sem seguir a tendência ditada, por exemplo, pela Europa ou por determinados grupos daqui.
Estudando a historiografia da nossa literatura percebi que mesmo sendo bom poeta, se não seguisse a tendência, muitas vezes acabava sendo marginalizado. Se bem que ainda hoje temos gente sendo colocada num canto por questões regionais. Tem muita gente que acaba indo para o Rio de Janeiro ou São Paulo para alcançar o reconhecimento literário, pois é necessário fazer parte do eixo Rio-São Paulo. Após o Modernismo surgiu espaço para inventar e reinventar poesia.
Alguns nomes brasileiros deste período que conheço por leitura e que destaco: Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, Mário Quintana, Vinícius de Morais, Murilo Mendes e Cecília Meireles. Estes me restringindo em um tempo e Língua.

Autoria da foto: Paula Laranjeira


12.Deixe a sua mensagem final. Qual é sua Palavra Fiandeira?



É muito bom, de alguma forma, fazer parte deste projeto – a revista Palavra Fiandeira – tão bem intencionado em promover a arte e a cultura não apenas numa perspectiva nacional, mas trazendo nomes, muitas vezes desconhecidos de outras partes do mundo e/ou trabalhando com temáticas oportunas. Espero que este meu jeito simples de viver, de pensar e trabalhar em prol das artes, em especial a literatura, seja oportuno e provocador de alguma nova reflexão. Estou muito feliz em poder dividir com vocês a alegria de amar a literatura e crer nela e em outras expressões artísticas como meio eficaz para propagação do pensamento reflexivo, que tem início nas artes e se reflete no homem, que por sua vez o projeta na sociedade. Desta iniciante no mundo da leitura um abraço carinhoso...
"Arte não é adorno, Palavra não é absoluta, Som não é ruído, e as Imagens falam, convencem e dominam. A esses três Poderes-Cidadãos não podemos renunciar, sob pena de renunciarmos à nossa condição humana." Augusto Boal





PALAVRA FIANDEIRA
Publicação digital semanal de Literatura e Artes
Edições aos sábados
Edição 86 —Paula Laranjeira 
Edição Especial de 06 de Outubro de 2012
PALAVRA FIANDEIRA
Fundada pelo escritor Marciano Vasques



Um comentário:

  1. obrigada pelo carinho de sempre. Me sinto felizaarda em poder ser parte de Palavra Fiandeira. Vamos juntos fiando e pespontando as artes...
    Um bj carinhoso, querido Marcian

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