A busca do encantamento é
inerente ao ser humano.
PALAVRA FIANDEIRA
PUBLICAÇÃO DE ARTE, EDUCAÇÃO E LITERATURA
DIVULGAÇÃO ARTÍSTICA E LITERÁRIA
ANO 4 —EDIÇÃO 125
20 DE JULHO DE 2013
PALAVRA FIANDEIRA:
EDIÇÕES SEMANAIS, AOS SÁBADOS
BARTOLOMEU CAMPOS DE QUEIRÓS
Reprise da Segunda edição de PALAVRA FIANDEIRA
1.Quem
é Bartolomeu Campos de Queirós?
—Sou
um mineiro tímido, que vivo em Belo Horizonte. Faço do silêncio um
companheiro definitivo. Escrevo para dividir minhas dúvidas e meus
espantos diante da fragilidade que é viver. Surpreendido pelo tanto
que não sei vivo cheio de perguntas. Na literatura eu posso indagar,
conjecturar, questionar, tendo como caminho a busca da poesia.
2.Seus
livros produzem o imediato efeito de encantamento para os que amam a
palavra. Mas a palavra está no mundo. Sendo assim, é necessário
atualmente investir no encantamento, não apenas na literatura, mas
na vida? Por quê?
—A gente nasce sem ser
ser consultado. Cai no mundo, se surpreende com a sua beleza, e já
estamos condenados a morrer. Esse escândalo nos faz levar tudo para
o campo da beleza. Sempre desconfio se de fato existe um objeto
estético que promove um olhar estético, ou se sensivelmente somos
capazes de promover a vida como uma inteira obra estética. A busca
do encantamento é inerente ao ser humano.
3.Literatura
Infantil é coisa apenas para crianças?
—Não penso em criança
quando escrevo. Faço apenas o melhor de mim. É meu estilo frases
curtas e em ordem direta. Isto facilita a leitura de meus textos
pelos mais jovens. Sempre que você se propõe a escrever com
destinatário o texto fica enfraquecido. Depois, literatura é para
todos. É preciso falar à infância e acordar a criança que dorme
no adulto.
4.É
visível a lapidação da palavra, o esmero, o cuidado, o zelo e o
primor em seus escritos. Na vida, devemos imitar a sua obra e também
nos aprimorar cada vez mais?
—Não
basta ter um bom assunto para fazer um livro. É preciso também uma
forma original, capaz de romper com o cotidiano da linguagem. A
unidade de um texto reside em sua forma e conteúdo. Aprimorar a
linguagem é lapidar a vida. O homem tem o tamanho da palavra que ele
sabe dizer.
5.O
escritor deve viver de acordo com a sua literatura? Ou seja, por
exemplo, viver de uma maneira ética, ou, viver em retidão, se por
acaso escreve para crianças, ou é possível e até aceitável a
separação entre o cidadão (autor) e a sua obra?
—A
literatura é feita de fantasia. Fantasiamos o que não temos.
Literatura, para mim, é feita de falta. Mas existem valores que são
encarnados em você e que se estendem na obra. Não há como se
afastar do que se é. Podemos perceber nas entrelinhas de um escritor
muito do que ainda está por dizer.
6.A
Língua é a morada, é onde habita a identidade do homem, do ser, de
uma gente. Qual a importância da Literatura no contexto da
preservação da identidade de um povo?
—A
língua é o nosso maior veículo de comunicação. É com ela que
nos expressamos, amamos, acusamos, difamamos, perdoamos, construímos.
Por ela tapeamos a solidão. Ela nos aproxima ou nos afasta. Nossas
diferenças são reconhecidas pela unidade da língua. Preservá-la é
nos aproximar.
7.Quando
sentiu, pela primeira vez, a força e a necessidade da Poesia (e ser
poeta)?
—Desde
sempre a poesia me surpreendeu por dizer tanto em poucas palavras.
Pela sua densidade, a poesia confirma melhor a capacidade inventiva
do leitor. A poesia deixa mais abertura para o fruidor fazer as sua
viagens. A poesia reconhece que também o leitor tem o que dizer. Dai
reconhecer de que a poesia é surpreendentemente democrática. Todos
encontram seu lugar.
8.De
que forma a Literatura pode melhorar a pessoa? Refiro-me à
Literatura, aos grandes romances, aos poemas.
—Sempre
que lemos nos somamos aos fatos, personagens, histórias do autor.
Para mim, ler é um processo de soma. Se lemos somos mais ricos.
Nosso acervo aumenta. Se nos tornamos melhores eu não sei. Todo
sujeito é também soma de hereditariedade e ambiente. Se soubéssemos
quem é o outro a literatura também seria desnecessária. O bom
texto literário deixa vir à tona a fantasia íntima do leitor e
essa fantasia desconhecemos. Mas creio que a literatura sempre faz
bem.
9.Se
tivesse que falar de um de seus livros, embora, claro, para o autor,
todos eles sejam importantes, mas, se tivesse que escolher, de qual
deles falaria? Por quê?
—Hoje
falaria do "Tempo de Voo" — Edições SM. É um texto em
que aproximo minha infância da minha velhice. Deixo conversar os
meus diversos momentos. Sou proprietário de um longo fragmento do
tempo. Sei que nada somei, apenas subtrai. Pode ser uma conversa de
peso, mas é uma conversa maior. Meu eu real conversa com o eu ideal.
10.Globalização,
informática, tecnologia, mídia... E a Poesia? Qual o seu
significado hoje?
—O
Futuro a Deus pertence. A poesia permanecerá sempre. Talvez o mundo
seja uma poesia do Criador. Depois, enquanto houver mistério,
enquanto desejarmos milagres, a poesia estará presente. Os mistérios
jamais esgotarão. Cada vez que a ciência desvenda um mistério mais
outros nos surpreendem.
11.Como
vê a questão das mudanças em alguns paradigmas atualmente, entre
os quais, a noção de Direitos Autorais (A Internet, a Criação
Coletiva de um texto, A terra de Ninguém...)?
—O
maior prêmio de um escritor é ser lido. Ter sua obra circulando é
um privilégio. Em livros, internet, é importante um leitor. Mas os
direitos devem ser respeitados. É preciso, ao lado de tudo, possuir
uma vida vivida com princípios éticos. Não podemos avançar
somente tecnologicamente. É preciso também prosperar com ética.
12.Você,
obviamente, é um grande leitor. Poderia falar de uma ou duas obras
que foram marcantes em sua vida, em sua formação? Na edificação
da pessoa e do escritor que você é?
—Tenho meus livros
preferidos e não são literários. São livros de teoria. Digo três
que me acompanham a vida toda: “ O Mito de Sísifo” de Albert
Camus; “Fenômeno Humano” de Teillard de Chardin: “Obra
Criadora” de Henry Bergson. São livros que me ajudam em cada nova
leitura. Eles em fazem prestar mais atenção à vida. Mas leio muita
literatura e de preferência poesias. Quando o tempo é pouco, você
lê uma poesia pela manhã e ela dura o dia inteiro.
Albert Camus
13.Erich
Fromm, Espinosa, filósofos, poetas. O poeta é como o filósofo. Às
vezes pensa na vida e na felicidade. O que é para você a
felicidade?
—Eu
vejo uma grande fraternidade entre a poesia e a filosofia. São
reflexões que surgem sempre diante de um incômodo em responder as
questões que a vida nos coloca. Surgem de indagações antigas,
desde que o matéria tomou consciência de si mesmo. Nos modernizamos
em determinados aspectos, mas continuamos antigos tanto quanto nossas
dúvidas.
Espinosa
14.O que é ser poeta?
—Poeta
é suspeitar. É ignorar a verdade. É apropriar-se do seu não-saber.
É necessitar do outro para confirmar a sua fragilidade diante dos
enigmas que a existência nos apresenta. Ser poeta é não ter
vergonha de perguntar.
15. As
palavras alteram sentidos através dos tempos, e de tanto uso, também
se desgastam. Nos grandes romances, nas grandes histórias (Tristão
e Isolda, etc), vive-se intensamente a paixão. E alguns dizem que
sentem paixão pelo que fazem. Poderia definir o que é paixão, para
Bartolomeu?
—Ter
paixão, para mim, é um estado de liberdade tão amplo que você se
abandona para viver o desejo do outro. Você ama tanto que se
escraviza em liberdade. É exercer a generosidade exageradamente e
com prazer absoluto.
Livro do autor
16. Falamos
de felicidade, de poesia, mas, para terminar, diga algo ou algumas
coisas que o deixam deprimido ou pelo menos muito triste.
—Tenho
cá minhas tristezas. Mas a maior é saber que somos capazes de
realizar a Paz, somos capazes de democratizar a razão e não
operamos neste sentido. Daí a minha confiança na literatura. Ela
nos torna mais flexíveis e quem sabe perceberemos, uma dia, que a
beleza pode nos arrebatar e viveremos em um mundo em que a única
palavra necessária será silêncio.
Bartolomeu Campos de Queirós nos deixou em 26 de janeiro de 2012
PALAVRA FIANDEIRA
DIVULGAÇÃO DE ARTES, EDUCAÇÃO E LITERATURA
ANO 4 —EDIÇÃO 125
REAPRESENTAÇÃO DA EDIÇÃO SEGUNDA DE PALAVRA FIANDEIRA
PALAVRA FIANDEIRA:
FUNDADA PELO ESCRITOR MARCIANO VASQUES
FUNDADA PELO ESCRITOR MARCIANO VASQUES
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PALAVRA FIANDEIRA abre-se para os créditos, solicitando colaborações.
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