EDITORIAL

PALAVRA FIANDEIRA é um espaço essencialmente democrático, de liberdade de expressão, onde transitam diversas linguagens e diversos olhares, múltiplos olhares, um plural de opiniões e de dizeres. Aqui a palavra é um pássaro sem fronteiras. Aqui busca-se a difusão da poesia, da literatura e da arte, e a exposição do pensamento contemporâneo em suas diversas manifestações.
Embora obviamente não concorde necessariamente com todas as opiniões emitidas em suas edições, PALAVRA FIANDEIRA afirma-se como um espaço na blogosfera onde a palavra é privilegiada.

sábado, 21 de novembro de 2009


ROCÍO L´AMAR - CHILE


 ENTREVISTA: 


Aproximação,

Abordando o pensamento poético de Ingrid Odgers



Por Rocío L´Amar

(especialmente para PALAVRA FIANDEIRA)

Disse alguém que "o poeta é o fundador do ser", e isto, certamente, nos induz a pensar, que o poeta É, o poeta é o que arquiva em si, o que salvaguarda, e "a poesia é fundação do ser pela palavra", então, de acordo com este postulado, a poesia é seu vestígio/ distintivo/coroação, sua perfeição, que é também o fim/morte do poeta, entendendo-se que o que prevalece é a obra em tempo real e não o poeta.

Tendo em conta esse pressuposto ideológico, social e cultural, atrevo-me a dizer que Ingrid Odgers é poeta, é criadora, é artista. Poeta, porque age com fervor nos pantagruélicos quixotismos. Criadora, porque por meio da palavra – como veículo imprescindível – vai mais alta do que qualquer tipo de enquadramento ou classificação. Artista, porque organiza e articula o coração da subjetividade das artes – como mundologia – , razão pela qual sua poesia é uma constante reivindicação feminista em seu contexto lúdico. 

A caracteriza uma infatigável devoção ao ofício/profissão poeta/escritora. E não oculta a relevância, e influência que teve a paixão de outros poetas/escritores em sua obra, quero dizer, reage diante dos mais imperceptíveis estímulos externos. 

Consegue da estética da sedução a filosofia da liberdade/simplicidade em seus poemas. Propícios para aproximar-se de uma leitura profunda. E no corpus do romance, permite que se observe as configurações formais do gênero. 

Com a irrupção da Internet, tendência dominante hoje em dia como modelo de difusão, a poesia está mais próxima dos leitores. Tem seguidores, que nas formas tradicionais de edição (formato papel) não é tão massiva. Assim mesmo, os desacertos das políticas dominantes – como no Chile – que castigam o livro com altos impostos, contribuem, junto a outros fatores, a que se paralisem publicações e NÃO chegue o livro a TODOS os setores da população, e à progressiva proliferação de blogs literários. 

Podemos então falar da existência de novos poetas e uma nova poesia? 

A este panorama convidamos a Ingrid Odgers a responder algumas interrogações. 



A PALAVRA FIANDEIRA DE INGRID ODGERS

                            
                                    Ingrid Odgers            


1. O/a poeta, formador constante do espanto e sem medo diante dos mistérios recorrentes nas representações estéticas com ideal de permanência, estará dispost(@) a afrontar os novos e fortíssimos impactos da indústria cultural? Quero dizer, em meio dessa virtualização, este show midiático, esta imediatez do instante digital, criar obras de qualidade, substanciosas, com inteligência, consagrando poéticas renovadoras?


– Sim, sem dúvida, o/a poet@, tem a ousadia para desafiar a indústria cultural e a valentia para criar e recriar estéticas, não para ajustar-se à indústria, porém, devido a que como criador está sempre aliado a um imenso sentido de liberdade plena. E é baseado neste livre arbítrio que se consolidam as bases de poéticas inovadoras e inteligentes. O/a poet@, o autêntico, não busca, então, a adaptação ao mercado, mas sim romper com os cânones tradicionais que transmitem uma academia ultrapassada e os lugares cansadoramente comuns, nos quais prolifera a infestação da oferta virtual atual, talvez por essa razão a indústria cultural e os/as artistas dificilmente caminhem juntos, as editoras e os escritores estão divorciados, ou melhor, os escritores estão "abandonando um mal matrimônio".


2. Há milhares de portais com milhares de poemas em Internet. Seria isso uma garantia de liberdade de expressão para o pensamento criativo ou apenas é uma possibilidade de exploração que se aproveita para o espetáculo e o aplauso em uma sociedade light?


– A rede de Internet está para todos. Certamente, é uma grande expressão de liberdade e também de libertinagem e como tal dá lugar ao light, ao vulgar, o intelectual e o banal. E considerando o anterior,sim, evidentemente, é a ferramenta da vez, do show, e aplauso de uma sociedade cada vez mais light.. Cada um/a sabe o que o leva a interagir e/ou adentrar-se nesta teia gigantesca e é, portanto responsável...Agora é o leitor ou internauta quem deve lapidar seus gostos se procura boa literatura e arte.

                                                   
            Ingrid Odgers

3. Sabemos que a poesia assume suas mutações...Não está em sua linguagem o vocábulo claudicar, retratar-se...É temperada com diversos estilos, simetria, ambientes. Pensa você que há rigor poético ou é uma poesia elaborada para as inclinações do internauta?


– Creio que existe um raro, quero dizer, escasso rigor poético e um escasso conhecimento da linguagem literária. Na realidade, poucos internautas têm conhecimento do que seja a POESIA, manejo da linguagem, estética, etc...E, como no mercado normal (livrarias,feiras do livro, exposições, etc), consomem o que a indústria (e a academia) deseja entregar em ambos espaços. Existe nula capacidade de crítica na sociedade devido à pouca cultura literária ou má qualidade da educação existente.


4. Certo é que a globalização impõe ao poeta outros rumos , outras direções. Também a melosidade do êxito e a fama...o inabordável/abordável. E como é difícil fazer da poesia um produto massivo, busca à deriva o bem estar nos olhos e ouvidos de uma realidade fática. Aproveitamento ou necessidade?


– Ainda que muitos desejamos que não seja assim, a poesia é e será de elite. Não é atrativa como o baile, a música popular ou o cinema. A poesia é para um público especial, de uma sensibilidade maior e de certa cultura, e, portanto, escasso.

Com efeito, muitos poetas caem no meloso, para aproveitamento daqueles que desejam viver da "paraliteratura", que não concebe o princípio da beleza em si mesma, senão, através de uma utilidade. Abarca também o terreno do ensino e instituições, onde o paraliterário é um feito fundamental diante da crise dos estudos literários, que se converterá em crise dos estudos culturais, algo a que não se pode impor prazo pela literatura. Portanto, lhes é conveniente a globalização, grande mercado e mais benefícios.



5. Existe, para Ingrid Odgers, algum poema de um autor(a) prodígios(@) que tenha querido escrever? Por quê?


– Claro que sim, me agrada, porque com ele me identifico, o poema de Enrique Lihn:


"Porque escrevi"



..."Em sua origem o rio é uma veia de água

– Ali, por um momento, sequer, nessa altura –

logo, ao final, um mar que ninguém vê

dos que estão nas braçadas da vida.

Porque escrevi fui um ódio inconfessável,

porém o mar forma parte de minha escritura mesma:

linha

da ruptura

em que um verso se espuma

eu pude renovar a poesia."...

Ingrid Odgers

Biografia:


Ingrid Ordegs Toloza. Concepción, Chile,1955. Escritora, poeta, narradora, crítica e gestora cultural. Tem, atualmente, 16 livros publicados, dois romances e um ensaio. é prêmio "Conselho do livro" 2002 e 2009. Criadora de diversos espaços virtuais, entre eles "Revista La Silla", Letras iberoamericanas, Antologias de poetas chilenos. É editora de Revista de Literatura Periferia, Região de BioBio, Chile. Atua como assessora cultural e diretora de oficinas literárias.


PUBLICAÇÕES:


Ángel dormido (1998)

Bajopiel (1998)

Arcoiris de vida (1999)

Copa de invierno (2000)

El retorno del ángel (2001)

La extraña barca del olvido (2003)

Náufragos en la ciudad (2003)

La llave de la otra historia (2005)

A puertas cerradas (Ensayo, 2005)

Más silenciosa que mi sombra (Novela, 2006)

En las frías rodillas del mundo (2006)

Memoria de un juego (2007)

La fusión de los signos (2007)

Estudio marginal- Comentario y crítica (Ensayo, 2008)


PRÊMIOS E DISTINÇÕES:


Postulada ao prêmio de arte e cultura, artes literárias Basldonero Lillo 2008, região do BioBio.

Prêmio Novela Fundo de apoio à iniciativas culturais 2008. Município de Conceição.

Sua obra integra a História da Literatura Hispanoamericana de Polônia 2008.

Os livros: Memória de um jogo, Nas frias voltas do mundo, A fusão dos signos, e o romance "Mais Silenciosa que minha sombra", que foram traduzidos ao Polonês.


Suas obras poéticas foram parcialmente traduzidas ao Inglês, Português, Francês ou Italiano.

Sua obra integra a Antologia de Literatura Hispanoamericana de Canadá.

Prêmio "Conselho Nacional do Livro e a Leitura", 2002.

Terceiro Concurso Nacional de Narrativa e Poesia Magoeditores - Santiago 2005.

Selecionada para representar o Chile em Encontro Mundial de Escritores em Chiclayo, Perú, ano 2002.


Designada Membro do Comitê Consultivo Nacional de Cultura em reconhecimento a seu vasto currículo e destacada trajetória no âmbito da Literatura.

Sua obra figura no estúdio Presença Feminina na Literatura Nacional - Lina Vera Lampereein - Edição 2007, corrigida e atualizada entre as destacadas escritoras Ana Maria Vieira e Paz Molina.

Sua obra figura na Cartografia Cultural do Chile (Mineduc 1999-2002)

No Catálogo lírico chileno (2002)

Em revistas literárias regionais, nacionais e internacionais (1999 e 2009) e em sites internacionais.

Foi convidada ao encontro Mundial de Poetas em Oaxaca, México, por seu trabalho acadêmico "Chile, Mulher, Literatura e Discriminação".


POESIA:


Pontos Cardeais


As palavras concluem o silêncio
Não parecem esgotar-se
Cavalgam o cérebro
Se é que não estou mergulhando nas lembranças
No que tocam meus olhos alertas
Zelosos
        Desbotados


Árvore e folha
Pandeiro e flauta


Tudo sucumbe ao Tom e ao Ritmo
flutuo despida
pelos pontos cardeais
Sedenta
Sou um segredo
    um estremecimento
                    um lamento
No simples gesto de acender a luz
e te olhar ao espelho na escuridão
Neste labirinto perco a visão
Crivando os lugares comuns


Deixam os pés no lodo
Caçador caçado

Sem armadilha
                    Sem rede

Caçador caçado

                    Caçado

Caçador

***************

Animais


E teu corpo cai em meu peito
e a palavra nos flancos
e nos fundimos num poema
e somos animais
fazemos
e desfazemos
e somos animais
que fazemos
e desfazemos

Em ti
Lentamente descobriste
Que a noite gira em tuas costelas
E se abre
E se estende
Até cair muito dentro
Até cair muito fundo
No trevo de teu sexo
E se estende
No eterno assovio do silêncio.


**************

Letras


Estes montinhos de pedras empilhadas
balbuciantes
rigorosamente calvas
desejam tomar bruscamente
algo de certeza
Tentam incinerar escuridão e cativeiro
Ocultas mordem o ventre
Assalta a sanidade tenebrosa
Caem sobre um papel de cinzas e chá envelhecido
Tudo é possível
Creio em absoluto
(É o risco que se corre)
Este monstro
Busca auxílio
Busca magia
Resplandecimento extinguido em neon e caos
Se arma em absoluta incerteza
símbolo de um frenesi que estende os braços
e abraça
Até comer os miolos com sua gula.

****

Original em Espanhol.

Tradução: Marciano Vasques

4 comentários:

  1. gracias, amor mío, por hacer posible que los poetas chilenos ampliemos nuestro horizonte,

    ¡¡¡eres maravilloso!!!...

    besos, Rocío

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  2. Obrigado, Rocío,
    Você tem um trabalho que considero fascinante, que é divulgar a cultura e os produtores de cultura de seu país, de América Latina e de nossa época, tão necessitada de poesia e de arte.
    Todos os poetas do Chile precisam ser divulgados, para que o mundo possa ser contemplado com essas vozes tão ricas. Que cada palavra, cada verso, de cada poeta chileno seja um recado, um sinal, para que a humanidade não perca jamais a esperança.
    Obrigado pelo carinho, beijos, e beijos,
    Marciano Vasques

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  3. Parabéns à Rocío e ao Marciano!
    À Rocío pela excelente entrevista. E nos dar a conhecer o trabalho de seus conterrâneos.
    Ao Marciano pela pessoa excecpcional que é, ao permitir que trabalhemos conjuntamente.
    Beijocas gorduchas aos dois.

    Carmen Ezequiel

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  4. Estimado Marciano, agradezco desde el alma el gran trabajo de traducción que realizas para apoyar a nuestra querida Rocío en la difusión de nuestra literatura. En lo personal exclamar ¡¡Infinitas Gracias!! y desearte muchísimas bendiciones, que tu bondad te sea multiplicada, igual por supuesto para Ro.
    Abrazo enorme,
    ingrid

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