REVISTA DE LITERATURA
ANO 1 - Nº4 - 29/NOVEMBRO/2009
NESTA EDIÇÃO:
-ARTISTAS CONTEMPORÂNEOS
-A FILOSOFIA DO SAPO
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Esta edição de PALAVRA FIANDEIRA recebeu um título curioso: DEZENAS. O motivo é justo. Apresentamos dez artistas contemporâneos, todos residentes em CASA AZUL DA ARTE. Para o deleite dos olhos, o leitor verá uma breve amostra do que de melhor se produz na pintura contemporânea.
A segunda atração de PALAVRA FIANDEIRA oferece dez breves textos de Literatura Infantil (para adultos lerem) escritos por Marciano Vasques, com seus sapos filósofos em suas conversas interessantes e produtivas, nas quais diversas questões contemporâneas são colocadas na pauta do brejo. Os curiosos anfíbios já conquistaram centenas de corações e resolveram trazer ao caro leitor de nossa revista as suas reflexões.
Com vocês, PALAVRA FIANDEIRA Nº 4
DEZENAS
UMA DEZENA DE ARTISTAS CONTEMPORÂNEOS
1. JERONI MIRA GALMÉS - Mulher Gaditana - Desenho/Aquarela/Pigmento - Madrid - Espanha
2. DIEGO DAYER - Médio Pudor - Óleo - Argentina
3. THAÍS IBAÑEZ - Circo Campestre - Óleo - Brasil
4. PEPE LINARES - Sem título - Óleo - Barcelona
5. DANIEL GARCIA - Geografia do tempo - Óleo - Barcelona
6. LEONID ABREMOV- Outono - Óleo - Rússia
7. MARÍLIA CHARTUNE - Aquarelas - Brasil
8. ROGÉRIA GILLEMANS - Mulher Angolana - Óleo - Angola
9. MARIA TARABAY - Angústia - Óleo - Argentina
10. GRAZIELA BELLO - Magia de estrelas - Acrílico/tela - Argentina
UMA DEZENA DE HISTÓRIAS DO BREJO
- Para, sapo! Vou te engolir.
- Quem vai engolir sapo?
- Isso já é moda no Brasil.
O sapo, educado, apela para o bom senso.
- Estou aqui para exercer o meu direito!!!
- O seu direito é votar! Não ficar falando...
- Deixe o sapo falar.
- Eu estou aqui há duas horas. Não quero ouvir papo de sapo. Ainda mais com este calor - disse uma eleitora com um colar.
- Eu quero ler.
- Eu quero voltar para o meu lar.
- Eu queria o mar.
O sapo decidiu calar.
Passado algum tempo, alguém resolveu provocar.
- Vai votar em quem, sapo?
O anfíbio, cândido, fala de seu candidato.
- Esse não, sapo!!! - berram na fila.
- Deixem o sapo votar em que ele quiser.
- O voto é secreto.
- Esse candidato vai transformar o país num brejo.
- Então está pra sapo!
- Vocês estão implicando com o coitado...
E assim foi até à hora do voto. Não deixaram o pobre em paz.
- E então, sapo, fez a sua parte?
- Fiz a primeira. Votei.
- E qual é a segunda, sapo?
- Fiscalizar. Isso vai levar quatro anos.
A LUA E A SAPABELA
No brejo, o sapo brejeiro, enamorado que só ele, tentava, com seus boleros de amor, conquistar a sempre tão distante e bela Lua.
Derramava ao luar a sua bonita voz.
Como se fosse o último romântico do século, tocava a sua viola e, bolerando, bolerando, declarava seu impossível amor pela insensível Lua.
Escondida entre as folhagens, a Sapabela, entristecida, ouvia o sapo cantor e suspirava.
- “Que pena que ele só pensa na Lua. Se ao menos lembrasse que eu existo!”
E o sapo a cantar desabafava!
- “Não adianta. A lua nem ouve os meus boleros. Serei sempre um sapo solitário...”
E porque às vezes o amor está tão perto, mas a gente nem repara, o sapo continuava sonhando com a distante Lua, dedicando-lhe seus apaixonados boleros de amor, sem ao menos ouvir, atrás das folhagens, o palpitante coração da Sapabela.
A PALAVRA ANDARILHA
Uma andorinha andarilha sobrevoava os dois amigos quando o Rospo começou:
- A palavra pode ter pesos diferentes...
- Explica isso direito Rospo.
- A palavra: "vagabundo", por exemplo...
- Sim?
- "Adorável vagabundo" é nome charmoso de um filme...
- Adorável vagabundo é o Carlitos...
- Isso, o Chaplin. Tem também "Coração Vagabundo", que é título de uma canção.
- Muito bonita, por sinal...
- Você conhece, Sapabela?
- Sim, estou sempre sintonizada...
- Mas é uma canção antiga...
- Sim, eu ia dizer: sintonizada com o que é bom...
- Outro exemplo é "A Dama e o Vagabundo".
- Um filme clássico de Disney...
- Muito bem...
- E daí?
- Acontece Sapa, que a palavra: "vagabundo" tem nuances poéticas...
- Sim, tem até uma música italiana chamada Giramondo, aqui gravada pelos "Os Incríveis" com o nome "O Vagabundo"...
- Até isso você sabe?
- Sapabela, meu!
- Então, como eu ia dizendo, dependendo do contexto a palavra "vagabundo" se torna leve, suave...Ou pesada, tão pesada que pode doer na alma...
- Ela também pode significar andarilho... Assim como você...
- Eu?
- Claro, o "Vagabundo da Filosofia".
- Meu Deus! Sapabela no pedaço!
- Tem definição melhor pra você, Rospo?
O SAPO QUE ACUMULAVA TESOUROS
Rospo encontra a amiga Sapabela.
- Rospo, você não tem nada na vida. Fica o tempo todo na beira da lagoa. Você precisa ter um patrimônio.
- Eu tenho...
- Ora, Rospo. O que você tem?
- Tenho amigos...
- Amigos?
- Sim, além da natureza...
- Natureza?
- Sim, fico aqui na beira da lagoa e sou feliz. Gosto de olhar para as borboletas, as flores, a mata, o azul do céu...
- Mas isso não é dinheiro, Rospo. Você precisa de moedas. Com moedas você compra tudo...Tudo é mercado, a vida funciona assim...
- Compro o azul? Compro o verde? Compro a paz? Compro a poesia?
- Você pode comprar uma revista de poesia.
- MAS NÃO POSSO COMPRAR A POESIA!
- Você pode comprar um avião e voar, pode comprar uma floresta...
- Mas não posso comprar os tesouros que acumulo dentro de mim.
- Dentro de você?
- Sim, dentro da minha consciência. O único lugar onde o mercado não funciona...
O SAPO QUE SABIA TUDO
Estava o Rospo passeando num assovio quando encontrou um sapo entristecido.
- Que é isso companheiro? Qual o motivo de tanta melancolia?
- Olá, Rospo. A vida perdeu a graça para mim...
- Não diga uma coisa dessas. O que aconteceu afinal?
- Eu sei tudo!
- Não brinca! Você sabe tudo? Pois devia estar feliz.
- Ao contrário, estou triste, altamente depressivo. A vida perde o sentido quando você sabe tudo. A mágica da vida está na curiosidade, no prazer e na felicidade das descobertas. Não tem graça nenhuma você saber tudo.
- Acho que estou começando a compreender o seu drama...
- Pois é, meu amigo. Feliz é você que tem tanta coisa para descobrir. Desvendar a vida é a sua própria arte.
- Mas sempre tem algo para a gente aprender. Tem certeza de que sabe tudo, meu amigo?
- Tenho. Queria tanto poder ser igual a uma criança.
- Sim?
- Viver o encanto do aprendizado, poder olhar o mundo com olhos de descobrir, mas sou aquele que sabe tudo, e por isso a vida perdeu a graça.
- Pobre amigo, eu ofereço a minha amizade.
Como todas as amizades verdadeiras, ela pode curar a sua tristeza.
- É mesmo?
- Ué! Você não sabia?
O SAPO E O PROVÉRBIO
Rospo adora provérbios, principalmente porque mexe neles.
E a Sapabela, claro, adora provocar.
-Ouça esse, meu amigo: "Quem cala, consente".
-Nem sempre.
-Ora, Rospo, você vive mudando todos os provérbios...
-Questionando, minha cara Sapa, questionando...
-Explique esse "Nem sempre".
-É simples.
-Manda ver.
-Numa ditadura, quem abre a boca pode morrer.
-Não havia pensado nisso.
-Claro, muitos se calam para não perder a vida, porém, jamais aceitam a opressão. Calar, às vezes, é preparar o tempo de gritar.
-Compreendi, calar e consentir são verbos que nem sempre combinam.
-Pois é, velhos provérbios, Sapa, velhos provérbios... A gente precisa dar uma sacudida...
-Mas às vezes é omissão, não é?
-"Bem, faltava o toque da Sapabela".
O SAPO E OS ENFEITES
Rospo visitando a amiga Sapabela. No meio do chá, observa o bonito vaso numa prateleira da estante.
- Que bonito! Realmente, um excelente enfeite para a mobília.
- Obrigado, Rospo. Tem um livro também, viu?
- Esse é enfeite para a alma.
- Para a alma?
- Exatamente. ele adorna a sua alma com a riqueza de suas páginas.
- Então, além de enfeitar a estante, ele embeleza a minha mente?
- Enfeitar a estante? Livro não é para ficar imóvel no móvel, Sapabela!
- Eu sei, Rospo, estava brincando. Quer ler esse?
O SAPO RICO
Casualmente, naturalmente, um novo encontro:
- Estou rico, Sapabela!
- Rico? Mas, você não tem nada, Rospo!
- Não exagere, Sapabela.
A provocativa amiga prossegue:
- Você não tem nem um celular novo!
- Mas, estou rico, minha amiga.
- Onde está essa riqueza, afinal?
- É riqueza para quem quer ver.
- Eu quero!
- Hoje, ao amanhecer, criei um poema. Poetizei.
- Um poema?
- Sim, depois de terminá-lo, percebi o quanto fiquei rico.
- "Tem razão: é riqueza para quem quer ver"
ROSPO E O MONSTRO
Rospo surge apavorado.
- O que foi que aconteceu, Rospo?
- Eu vi, Sapabela, eu vi! A mais terrível das criaturas.
- Você está tremendo. Fale, meu amigo. Calma!
- Jorrava sangue pelos olhos, babava, olhar ameaçador, dentes pontiagudos, garras medonhas...
- É um monstro.
- Sim, o pior que poderia existir. Nojento, repugnante, asqueroso...
- Onde você encontrou essa criatura nefasta?
- Na praça. Vi uma criança abandonada, pedindo esmola, e uma outra adormecida num banco.
- Não entendi. E o monstro horrível?
- As pessoas passavam e nem se importavam com elas, fingiam que não estavam vendo...
- Compreendi. Você viu o monstro da indiferença.
SAPABELA E A DIVERSÃO
- Rospo, continuo na minha incansável busca da felicidade.
- Quer jogar xadrez, Sapabela?
- Não procuro diversão. Busco a felicidade.
- Vamos ao cinema? Quer jogar boliche?
- Não, Rospo, não...
- Ao baile?
- Rospo, tente entender: eu procuro a felicidade.
- Você já sabe onde encontrá-la, Sapabela...
- Pois é, meu caro amigo, enquanto não a tiver dentro de mim, as coisas que você falou não passarão de apenas diversão...
son entretenidos tus cuentos con los personajes del sapo y la rana... diría que didácticos, aunque para jóvenes mayorcitos,
ResponderExcluirbeijos, Ro
Uau! Duplo presente, contos e artes contemporâneas.
ResponderExcluirDiga-se de passagem que me entretive por mais tempo que poderia, mas me encheu de prazer, Marciano. Bravo!