PALAVRA FIANDEIRA
REVISTA DE LITERATURA
REVISTA DIGITAL LITERÁRIA
ANO 2 — Nº 53 — 08/02/2011
NESTA EDIÇÃO:
Diretamente de Espanha
ANTONIO PORPETTA
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ANTONIO PORPETTA
1. Quem é Antonio Porpetta?
2. Tem viajado pelo mundo e conhecido gente. Fale aos nossos leitores dessa alegria. O que representam para o senhor esses encontros?
— A oportunidade de conhecer gentes, paisagens, vidas, costumes, apaixonantes. Ter encontros com seres humanos de uma qualidade inimaginável. Comprovar que ser poeta é bem mais do que uma habilidade para "escrever poemas". Reafirmar-me como pessoa entre pessoas. Entregar e receber.
3. Um de seus poemas diz que "nossa vida acaba sendo um dia". Fale, por favor, sobre isso.
— Acredito que os poemas não devem explicar-se: que cada leitor busque e encontre neles sua própria explicação. De todo modo, nesse poema — "Um dia" — trato de resumir a alegria de viver e a esperança em nosso viver cotidiano.
4. Tem um livro em Português. Qual o tema desse livro?
— É uma pequena antologia de quatorze poemas meus relacionados com o mar. Foi publicado, em idêntico formato, em Espanhol, Francês, Italiano e valenciano. Além do Português. O mar está presente com muita frequência em minha obra, como realidade e como símbolo. Amor profundamente "Meu mar" Mediterrâneo.
5. Um poeta que "não entende quase nada de blog". Para muitos, estamos entrando na era da tecnologia, que irá substituir a era humanista. Como vê a influência e o futuro da tecnologia na vida das pessoas?
— A tecnologia é muito útil para nos facilitar muitas coisas. Porém nada mais. Não deve converter-se em obsessão. E, claro, não remover o humanismo, epicentro de nossa dignidade como pessoas. Paradoxalmente, creio que a tecnologia pode nos ajudar a ser mais humanos.
6. Como se tornou poeta? Quando sentiu pela primeira vez que não poderia viver sem a poesia?
— Faz anos, a morte prematura e inesperada de um queridíssimo amigo me impulsionou a escrever algo em suas memória e homenagem. Sem esperar ou ao menos tentar, eis que resultou num poema. Assim me dei conta de que a poesia era para mim o meio idôneo para canalizar os meus sentimentos mais fundos. E desde então, junto a sua leitura, a criação poética foi o foco de minha vida.
7. Tem uma obra considerável: Livros de poemas, de contos, de ensaios, de teses acadêmicas. Qual o seu primeiro livro de poesia?
— Intitula-se "Por un Cálido Sendero" (1978), e é um livro em conjunto com minha esposa, Luzmaria Jiménez Faro (no total: a metade dela e a metade minha, com poemas separados) Foi ideia dela. Desde então, estamos visitando esse caminho - pleno de vida e de poesia -, cada vez mais cálido, com mais ilusão e mais esperança. Como todo primeiro livro, tem mais ternura que técnica.
8. Certamente recebeu prêmios literários. Como vê o prêmio na carreira de um escritor?
— Além de satisfazer o ego e da confirmação do próprio crivo literário, na Espanha servem, sinceramente, para publicar. As editoras raramente apostam na Poesia. Se o prêmio leva, além disso, a um acréscimo econômico, com a publicação do livro premiado, o autor pode ver sua obra difundida, com a possibilidade de ser lida por muitas pessoas.
9. Quais os temas predominantes em sua poesia?
— Não há mais que um: a vida. A vida em todas as suas vertentes, variantes e manifestações. Essa vida a que, em um de meus poemas, chamo "um absurdo milagre", que nos é concedida para nosso desfrute e nossa humana realização.
10. Tem viajado para diversos países da América Latina e de América Central. Poderia falar algo sobre a poesia contemporânea de América de fala espanhola?
— Geralmente, a poesia é muito respeitada e muito querida em quase todos esses países. Há grandes vozes poéticas e os poetas são admirados — às vezes, quase como seres superiores — publicamente quanto reservadamente. Os espanhóis temos muito que aprender com eles.
11. Diz que escreve toda a sua poesia numa torre. Que local é esse?
— É uma torre, na Sierra Madrileña (tem uma foto dela em meu blog), na qual me exilei para escrever, apenas interrompido — melhor, vestido — pelo canto dos pássaros. Dentro tenho um formoso sino do século XVIII, procedente de um velho convento, que sempre faço badalar quando termino um poema, como celebrando o nascimento de um novo ser.
12. A poesia é ainda necessária no mundo hoje?
— Hoje, mais do que nunca. É quase a única coisa que nos poderá salvar da mediocridade, a vulgaridade e o materialismo reinantes. Creio, sinceramente, que sem poesia não valeria a pena viver.
13. Teve livros traduzidos para outras partes do mundo?
— Sim, além dos anteriormente citados, coletâneas poéticas completas de minha lavra, foram levadas ao Alemão, Inglês, Russo, Sérvio, Árabes... Tenho tido sorte nesse aspecto.
14. Tem uma praça inaugurada com o seu nome. Qual é a sensação desse acontecimento e onde fica essa praça?
— A inauguração ocorreu em 30 de Janeiro de 2010, em Elda, meu povoado natal, na província de Alicante (uma cidade de 60.000 habitantes integralmente dedicada à produção de sapatos femininos). Foi uma emocionante demonstração de carinho sobre minha pessoa e minha obra.
15. De acordo com algumas previsões, o livro de papel desaparecerá com o avanço da informática, pois — dizem — o futuro é do livro virtual. O que pensa sobre isso?
— Não sei o que acontecerá. Porém, eu não posso prescindir do "prazer erótico" da leitura: a carícia dos dedos sobre o papel, o gozo sensível ao virar as páginas, o mesmo aroma da folhas, a adoção de uma postura adequada em qualquer lugar da casa ou em qualquer outro recanto, a mesma estética colorida dos livros em uma biblioteca... Um livro é muito mais que "algo" para ler: é "algo" para sentir e para ser mais feliz. O virtual jamais poderá substituí-lo.
16. Borges, nos anos 70, numa conferência na Argentina, disse que o livro é um objeto de culto, não no sentido religioso. Mas como zelo, respeito. Como interpreta essa declaração?
— Absolutamente de acordo, como bem disse na resposta anterior.
17. Conhece algo de Literatura Infantil?
— Conheço muito pouco. Parece-me um gênero extremamente difícil. O mundo das crianças é apaixonadamente complexo: adaptar-se a ele requer uns dotes literários e humanos muito especiais. Eu não os tenho.
18. Poderia citar algum livro que tenha lido e que tenha influenciado a sua vida ou transformado o seu pensamento?
— A lista seria demasiada longa. Cada livro que se lê modifica de alguma forma a vida do leitor, pois lhe proporciona, com maior ou menor impacto, novas experiências vitais, novas perspectivas, ou desperta adormecidas memórias.
19. Diante da tumba de León Tostoy; num encontro internacional de escritores em Belgrado: considera-se um escritor do mundo?
— Sem nenhuma vaidade, sim, considero-me um "escritor no mundo", felizmente cosmopolita. Por uma série de circunstâncias, desde 1985, em que realizei minha primeira leitura fora da Espanha, em Guatemala, tive o privilégio de levar minha poesia, e a poesia espanhola, de maneira geral, a muitas partes e diante de muitos auditórios. Fornecerei a você uns dados: que resumem esses vinte e cinco anos de atividades internacionais: 101 viagens ao exterior, 28 países visitados nos cinco continentes, muitos deles repetidamente. Um milhão de quilômetros de voo (aproximadamente, 25 voltas em torno da Terra), 356 atividades acadêmicas e culturais realizadas em 156 universidades e centros culturais... Que os leitores possam me perdoar por tantas estatísticas, mas é porque me sinto realmente plenamente recompensado por esse trabalho.
20. Se tivesse que escolher um de seus poemas para os leitores de PALAVRA FIANDEIRA, qual deles aqui deixaria?
— Eis que elegeria um muito breve, o menor que escrevi. É de meu livro "Silva de estravagancias", e diz assim:
... E pensar que estas rosas
não sabem que são rosas,
e entrarão na morte sem sabê-lo...
21. Conhece algo da Literatura brasileira?
— Envergonho-me confessar que sei muito pouco de sua Literatura. Porém, considero imprescindível, por exemplo, a poetas como Vinícius de Moraes, Ledo Ivo ( a quem conheci o ano passado — 2010 — em Bogotá), Cecília Meireles, Drummond de Andrade... Grandes vozes da Poesia Universal.
22. O que é o prêmio espanhol "Fastenrath"?
— É o mais antigo prêmio literário de Espanha (creio que surgiu em 1909). É concedido pela Real Academia da Língua Espanhola ao livro mais destacado (alternadamente, de Poesia, Romance e Ensaio) dos cinco anos anteriores. Foi concedido em 1987 ao meu livro de Poemas “Los sigilos violados”.
23. Seu poema "Las Sirenas" considero intrigante e profundo. Poderia nos comentar o que originou esse poema?
As pobrezinhas sereias necessitavam de uma reivindicação: não eram gente más. Sinceramente, nem sabiam que seus cantos encerravam a morte. Se os houvessem sabido, tenho certeza de que teriam permanecido bem caladas. Nesse poema, coloco-me ao lado delas e as defendo. Tinha que fazer isso.
24. Para um poeta basta a inspiração ou a técnica é imprescindível?
— Eu responderia como respondeu San Juan de La Cruz a uma pergunta semelhante: "Alguns versos me são ditados por Deus. Porém, a maioria, eu os invento". Sem chegar a esse contato com a divindade, creio que no processo criativo tem algo de "inspiração" e muito de técnica. O poeta tem que se deixar na folha branca alguns chips de sua própria vida. Ainda que sem magia de nada serviria o fazer poético.
25. Seus pais eram portadores de uma cultura erudita, que incluiu a música clássica e uma ampla biblioteca. Considera que o meio ambiente influencia nos rumos da vida de uma pessoa?
— Tive essa sorte. Todavia o ambiente, às vezes, "influencia", não "determina".
26. Seu livro "HISTORIAS MÍNIMAS Y OTROS DIVERTIMENTOS" trazem contos curtos. Numa época de texto curto (Twitter) o romance de texto longo sobreviverá?
— Naturalmente que sobreviverá! O que não sei é "como" irá sobreviver. Desde os mais velhos tempos todos necessitamos que nos contem histórias, que nos levem com a imaginação a mundo reais ou fictícios, que, de uma maneira ou outra, nos façam sonhar... A literatura cumpre essa função social imprescindível: que o homem consiga "ser" além de "estar".
27. Conte-nos sobre o seu livro "Memórias de um Poeta Errante."
— Eis que é um livro no qual um poeta errante (eu) expõe suas memórias. Agora, falando seriamente: nele recolho detalhadamente todas as minhas andanças literárias pelo mundo. Pessoas — de nosso ambiente ou não — povos, paisagens, anedotas, experiências... Tudo o que foi por mim vivido em minhas viagens pelo estrangeiro, amplamente exposto. Há, como é natural, momentos tristes, alegres, divertidos, preocupantes, perigosos... É um livro, em suma, pleno de vida... Porém, de vida "vivida".
28. Que palavras e mensagem deixaria aos leitores de PALAVRA FIANDEIRA?
— Que não deixem de visitar e recomendar este magnífico Blog, de tanto interesse para os que amam a literatura. Bem construído, atraente, com sugestivos textos... Um luxo para escritores e leitores.
Também, meus agradecimentos aos que aqui chegaram na leitura desta entrevista. (Agradecimentos extensivos, claro, ao Marciano Vasques, que tão amavelmente a propôs e a tornou possível.)
E finalmente, se têm um tempinho livre, lhes agradeceria muito que me visitassem em: http://www.porpettablog.com
E finalmente, se têm um tempinho livre, lhes agradeceria muito que me visitassem em: http://www.porpettablog.com
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TRADUZIDO DO ESPANHOL PARA O PORTUGUÊS POR
MARCIANO VASQUES
PALAVRA FIANDEIRA
Fundada pelo escritor Marciano Vasques
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Buenos días Marciano:
ResponderExcluirGracias por publicar esta entrevista.
Hoy he sabido de este poeta, que no conocía.
Poco a poco ya voy entendiendo cada vez más el portugués.
Me ha encantado esta conversación que habéis mantenido.
Enhorabuena, Montserrat
Antonio dice que posiblemente la tecnología del internet nos puede ayudar a ser más humanos... aunque no concuerdo con él, he visualizado su tremenda humanidad en esta entrevista, las preguntas directas que le has hecho, Marciano, lo confirman, respuestas sencillas, escuetas y sobrias, propias de los espíritus altruistas...
ResponderExcluirfelicitaciones, para ambos, desde Chile, Rocío
É bom demais compartilhar pensamentos e sentimentos. Principalmente, a respeito de poesia.
ResponderExcluirLinda entrevista. Parabéns, Marciano!
Bj,
Regina Sormani
Grande entrevista. Eu gostei do lado humano deste poeta.
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