EDITORIAL

PALAVRA FIANDEIRA é um espaço essencialmente democrático, de liberdade de expressão, onde transitam diversas linguagens e diversos olhares, múltiplos olhares, um plural de opiniões e de dizeres. Aqui a palavra é um pássaro sem fronteiras. Aqui busca-se a difusão da poesia, da literatura e da arte, e a exposição do pensamento contemporâneo em suas diversas manifestações.
Embora obviamente não concorde necessariamente com todas as opiniões emitidas em suas edições, PALAVRA FIANDEIRA afirma-se como um espaço na blogosfera onde a palavra é privilegiada.

sábado, 11 de agosto de 2012

PALAVRA FIANDEIRA — 78





PALAVRA FIANDEIRA

REVISTA DIGITAL LITERÁRIA
PUBLICAÇÃO SEMANAL DE LITERATURA E ARTES
EDIÇÃO SEMANAL 
ANO 3 — Nº78
11 agosto 2012


AKIRA YAMASAKI





1.Quem é Akira Yamasaki?


Um cara que completou 60 anos de idade em agosto deste ano. Moro no Jardim das Oliveiras, no Itaim Paulista, e trabalho no Metrô. Sou casado com Sueli Kimura desde 1981 e pai de Clarice e André que estão crescidos, posso garantir que tenho uma família maravilhosa. Considero-me um homem comum que acorda às cinco da manhã como tantos, perde duas horas em conduções lotadas para chegar ao serviço, duas para voltar para casa e está sujeito a todas as pressões sofridas por um homem comum nesta São Paulo gigante nos dias de hoje.


2.Naturalmente que sua história cultural e literária em São Miguel Paulista está fortemente enlaçada com a história do MPA. Pode expôr ao leitor o que foi esse movimento cultural e artístico e de que forma tornou-se tão especial em sua trajetória de vida?


O Movimento Popular de Arteo MPA, entrou na minha vida em 1978 quando fui convidado pelo poeta e compositor Edvaldo Santana, que eu conhecia pouco tempo,na época ele liderava o Grupo Matéria Prima, para participar de um reunião na Capela Histórica de São Miguel Paulista para discutir a reforma e revitalização da capela e formas de ocupação posterior da mesma. Esta discussão estava sendo conduzida por dois antropólogos de Campinas a serviço da Secretaria de Cultura, o Antonio Augusto Arantes e Tadeu Giglio, que defendiam uma ocupação dinâmica do espaço e tinham mapeado a comunidade artística e cultural do bairro. Esta reunião foi o meu primeiro contato com os artistas e produtores culturais da região, onde tomei contato com a enorme diversidade e riqueza artística e cultural que existia no bairro, composta de poetas, artistas plásticos, cantores, compositores, grupos de música, de teatro, de dança, reisados e tantas outras manifestações que encheram os meus olhos e conquistaram o meu coração para sempre.


3.Poderia nos citar alguns desses artistas que marcaram a história do MPA?

 Foi nessa época que conheci artistas do naipe de Pedrinho e Eulália Perez, Sacha Arcanjo, Cláudio Gomes, Severino do Ramo, Raberuan, Acauã, Osnofa, Zulu de Arrebatá, Chico Guedes, Celso Frateschi, Cléston Teixeira, Sueli Kimura, Chico Edú, Esinho, Tomaz de Lima, Artênio Fonseca, Fátima Bugolin, Jorge Gregório e tantos que não recordo os nomes agora.


Sacha Arcanjo


4.Que acontecimento pode ser, em sua opinião, considerado o marco do MPA?


Considero que o mote para o surgimento do MPA foi a proposta da Mostra Cultural realizada na Capela Histórica em 1978, que gerou uma convivência quase que diária entre seus participantes e uma cataclísmica explosão de energia criadora coletiva que eu nunca tinha visto antes e nunca vi depois, poemas nasciam como capim ruim, parcerias, grupos musicais e teatrais brotavam nas mesas dos bares e nas praças do bairro, e ideias explodiam a todo instante num movimento contínuo que persistiu pelos 05 anos seguintes promovendo ações que mudaram a face cultural da região. para dar uma ideia da dimensão do itinerário percorrido pelo MPA neste período dou alguns exemplos das ações desenvolvidas pelo grupo: ocupação artística e cultural de ruas e praças com as Praças Populares de Arte, foram mais de vinte durante o período, e que deram origem à Praça do Forró; criação dos Cadernos de Poesia do MPA, foram oito; criação da Casa do MPA, espaço equipado com um pequeno estúdio de som e um pequeno teatro, cabia umas oitenta pessoas, para realização de apresentações, oficinas e cursos de arte; criação do MPA Circo, espaço que funcionava como um centro cultural e promovia atividades durante a semana inteira com realização de oficinas culturais, palestras, debates, cursos de arte, intercâmbio com escolas da região e com apresentações artísticas às sextas-feiras, sábados e domingos, intercalando artistas da periferia com nomes consagrados pela mídia, e, cabe aqui um destaque importante, a ideia do MPA Circo foi exportada para outras regiões da cidade de São Paulo como Campo Limpo, Pirituba, Imirim, Tucuruvi e Butantã através da Secretaria de Cultura; participação efetiva junto com outros movimentos culturais da região na criação do Centro Cultural do Itaim Paulista. O MPA enquanto grupo organizado terminou por volta de 1985 e o resumo da ópera é que ele foi essencial na minha vida, a mim que não tenho nenhuma formação acadêmica, ele me deu régua, compasso, alicerce e cabedal para enfrentar a vida de frente e de cabeça erguida.

                                                              


5.Entre os seus expoentes poéticos, ressalta com propriedade um autor chamado Francisco Xavier, e fala da Casa da Farinha. Pode nos contar, por favor, sobre a história e a importância para você desse espaço e seu fundador?


Francisco Xavier é uma aquisição afetiva bem mais recente, do início deste ano. Ele me foi apresentado por alguns amigos do peito que resolveram que não posso morrer sem publicar meus poemas em vida, a saber, o Sílvio Kono, o Luiz Casé, o Ronaldo Ferro, o Sílvio de Araújo e o Sacha Arcanjo, que idealizaram o Projeto Bentevi, para levantar recursos para produção de um livro meu de poesias. A aproximação com o Xavier se deu em função deste projeto, que ele disponibilizou a Casa de Farinha, de propriedade da sua família, para a realização de 08 eventos culturais protagonizados por dezenas de amigos artistas e produtores culturais, no período de 07 de abril a 18 de agosto de 2012, data marcada para o lançamento do livro. Do Francisco Xavier posso dizer, pelo pouco tempo de convivência que temos, que ele se torna a cada dia que passa uma pessoa cada vez mais querida e fundamental. E de quebra, não posso deixar de mencionar que não bastasse ele ser médico bem sucedido e renomado na região, onde uma aura de confiança e respeito ilumina a sua pessoa admirada e, não bastasse ainda ter construído juntamente com sua família, um pequeno pedaço do Piauí dentro de São Miguel Paulista, a Casa de Farinha, espaço de convivência e de preservação da cultura e costumes do povo nordestino e, em particular, dos caatingueiros, que fazem da casa um ponto de encontro onde defendem suas identidades e matam saudades da terra natal por meio da comida, da música e da arte, não bastasse tudo isso, ele ainda é um poeta de mão cheia.
Casa da Farinha


6.É autor de obra emocionante em parceria com o cantor Raberuan. Que tal se nos contasse alguns momentos vividos artística&poeticamente ao lado desse compositor e interprete que recentemente nos deixou?


Desde os primórdios do MPA em 1978, desde aqueles tempos heroicos, eu e Raberuan nunca fomos muito próximos a ponto de um frequentar a casa do outro, com exceção de uma época que ele morou na casa de Sacha, e sempre mantivemos uma amizade respeitosa e meio à distância. Raberuan morreu em novembro de 2011 com 58 anos de idade em circunstâncias que todos conhecem e eu tive uma convivência mais próxima e de forma contínua com ele a partir de 2004, mais ou menos, quando nos aproximamos vindos cada um das profundezas de um exílio particular: ele emergindo da escuridão e do inferno das drogas e eu do nevoeiro de uma crise existencial e de criação que duraram alguns bons anos, talvez um bom terapeuta possa explicar isso algum dia.
Raberuan


7.Ainda falando de Raberuan, conte-nos o que foi o projeto “Memória Musical”.


Acho que o nosso encontro em 2004 foi o encontro da fome com a vontade de comer porque eu vinha com uma proposta na cabeça, o Projeto Memória Musical em São Miguel Paulista, que tem o objetivo de registrar as obras musicais dos compositores da região para que não se percam no anonimato de algumas dobras do tempo e ele tinha centenas de canções que eu reputo da mais alta qualidade e sensibilidade que não tinham nenhum registro convencional e eram divulgadas apenas no velho sistema dode boca em boca. A partir deste encontro realizamos o primeiro CD de Raberuan, oTIÃO, que foi a pedra de toque para desencadear uma série de eventos que considero importantes no contexto do desenvolvimento cultural na região: formatamos conceitualmente, juntamente com Sueli Kimura, o Projeto Memória Musical em São Miguel Paulista e como produtos palpáveis deste projeto gravamos quatro CDs de compositores da região, a saber, oTIÃO, de Raberuan, oSACHA, 60, de Sacha Arcanjo, oPRA MIM, de Osnofa, e por último, oOUVINDO O CORAÇÃO, de Gildo Passos, que vamos lançar no dia 16/06, no Projeto Bentevi, mas que ainda teve a Direção Musical de Raberuan; conceituamos e realizamos juntos vários projetos voltados para a divulgação da arte produzida na região e criação de público para essa arte, dentre os quais destaco os projetosIntegração e RupturasIR, realizados em conjunto com Gilberto Braz, Cleston Teixeira e Carmelita Saraiva, nos CEUs da região, o Cesta de Artes na Sexta, realizados no Metroclube Itaquera, para empregados do Metrô e familiares, oQuintas Culturais, realizado no Bar do Wlad em Ermelino Matarazzo, e o Sarau da Casa Amarela, na Casa Amarela. Montamos também, em parceria com Gilberto Braz e Cléston Teixeira, um espetáculo poético-musical chamadoUm no cotidiano, com o qual corremos trecho no período de 2008 a 2011 e que deu margem a uma obra conjunta, não com Raberuan, mas também com Cléston e Gilberto, porque escrevíamos e fazíamos canções de encomenda para o espetáculo que mudava constantemente de uma apresentação para outra e acho que reside o segredo para o surgimento da parceria emocionante a que você se refere.


8.O que é a Casa Amarela?


A Casa Amarela é uma herança de família que resolvemos, Sueli e eu, enquanto são resolvidas algumas pendências de inventário, utilizar como um espaço alternativo e independente, onde pudéssemos desenvolver potencialidades artísticas, culturais e outras. Literalmente, a Casa ainda está em construção física, necessita de reforma urgente devido a muitos anos de uso sem as necessárias obras de manutenção, e conceitualmente. A construção conceitual pretendemos que seja permanente, uma encubadora de ideias e liberadora de energias e ações onde pessoas e talentos se agreguem e deem suas contribuições.
Dentre osmoradoresda Casa estão o IPEDESHInstituto de Pesquisa e Desenvolvimento Social e Humano e o grupo teatral Alucinógeno Dramático, além de pessoas que aproximam-se e participam das atividades da casa de forma individual. Maiores informações podem ser obtidas nos blogues:


9.O que são os saraus da Casa Amarela?


Quanto aos Saraus da Casa Amarela, eles foram criados para tentar preencher um vazio de discussões, debates, informações e até de divulgação de curiosidades que sempre existe no processos de criação artística dos produtores da região. Por isso o formato deste sarau inclui sempre a participação de um convidado especial que além de apresentar, também discute seus trabalhos com os presentes e fala sobre suas experiencias de vida e referencias artísticas e culturais que o influenciaram. Costumo dizer que o Sarau da Casa Amarela é maisum nós com nósentre a comunidade artística e cultural da região, sem maiores preocupações com fluxo de público mas, sim, com a discussão dos procedimentos de criação de cada artista.
Sarau na Casa Amarela


10.O que é o projeto Bentevi?


É uma ação entre amigos para levantar recursos para produção e edição do BENTEVI, ITAIM, um livro meu de poesias e um CD com canções criadas em parceria com compositores da região.
Como mencionei, a minha aproximação com Francisco Xavier se deu em função deste projeto, que ele disponibilizou a Casa de Farinha, de propriedade da sua família, para a realização de oitos eventos culturais protagonizados por dezenas de artistas e produtores culturais, meus amigos, no período de 07 de abril a 18 de agosto deste ano, data marcada para o lançamento do livro.

Vozes da poesia no projeto Bentevi

11.Foi no MPA que conheceu o amor de sua vida. Conte, por gentileza aos nossos leitores, como foi esse encontro, e como você vivencia o amor e suas paixões, como a arte, o teatro, a música. De que forma tudo se entrelaça no ser Akira?


Foi no MPA também que conheci Sueli Kimura, magra como um ramo espichado de sakura, japonesa de olhos indaquentos e inteligencia incômoda, beleza oriental de traços suaves e intrigantes. Paixão fatal e casamento.
Sueli Kimura


12.Que palavras deixaria aos nossos leitores. Qual é sua PALAVRA FIANDEIRA?


Sou um homem comum que joga futebol aos domingos de manhã e é fiel às suas alegrias, amizades e coisas em que acredita e que às vezes é irrigado e contemplado por um olhar diferente sobre suas relações com o cotidiano: o olhar da poesia.
Esse olhar é a minha Palavra Fiandeira.



PALAVRA FIANDEIRA
Revista Digital de Literatura e Artes
Publicação Semanal aos Sábados

Edição 78, em 11 de Agosto de 2012
Edição AKIRA YAMASAKI
PALAVRA FIANDEIRA:
Fundada pelo escritor Marciano Vasques
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RABERUAN!



2 comentários:

  1. Maravilha de tudo! Evoé, Marciano Vasques pela sagacidade e argúcia na condução do leme dessa nau! Axé, Akira Yamasaki, pelo desprendimento poético que emana em sua pele como suor.
    Obrigado pela existência de ambos em nossas vidas! Amém!

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  2. É muito bom a gente se aprofundar nas origens do MPA... Movimento importantíssimo para nossa arte. Parabéns a todos que de uma maneira ou outra contribuíram nessa construção... Vários nomes saíram dali nos diversos ramos da arte... Um abração, e muito obrigado Akira, por esse depoimento.

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