...infelizmente ainda somos um país racista.
O educador deve ser um cidadão do mundo e do seu tempo, permanentemente atualizado com o que está acontecendo e comprometido com a mudança. A educação é um ato político, já dizia Paulo Freire (...)
PALAVRA FIANDEIRA
ARTE, EDUCAÇÃO, LITERATURA
Publicação digital de divulgação cultural
EDIÇÕES SEMANAIS
ANO 5 — Edição 145
15 de Março 2014
MARIA RITA PY
1.Quem é
Maria Rita Py?
Sou
apaixonada pela vida, pela natureza, pelo Sol e pela Lua. Herdeira de Deus que
vê em todos os seres um irmão de caminhada. Persigo a justiça, a verdade e a
felicidade na construção de um mundo melhor. Sou um condor andino em pleno voo.
No poema Maria de Todas as Luas assim me defino: “ Sou instável, temperamental, afetuosa e
sentimental. Misteriosa, impulsiva, senhora do meu destino, por isso me chamam
lua: Maria-lua”.
2.É
uma pessoa comprometida com a luta contra o racismo. Definitivamente, acredita
que o racismo continua em nosso país? Vê indícios? Que nos poderia dizer sobre
isso?
O racismo é uma ideologia que prega a supremacia de um grupo étnico sobre
outro, assim como acredita que determinado grupo possui defeitos de ordem moral
ou intelectual. No Brasil crescemos sobre a égide da democracia racial, que propalava vivermos em relações harmoniosas
entre pretos, pardos e brancos, e em plena
igualdade, contudo os índices de desenvolvimento mostravam o contrário,
e um imenso abismo social separava brancos e negros. .A não inclusão social do povo negro e
indígena, a invisibilidade da presença
do negro nos livros didáticos ou na literatura, o reforço de estereótipos
imputados a negros, o racismo cordial que aparece na forma de piadas ou
apelidos, o extermínio da juventude negra e os
casos de racismo que ocorreram nos últimos dias na área esportiva comprovam
que infelizmente ainda somos um país racista.
3.Faz
parte da CAPOSM, como é conviver numa entidade de escritores e poetas?
É sempre uma bênção, uma experiência única, pois a
Casa do Poeta de Santa Maria congrega associados com diferentes formações
acadêmicas e diferentes faixas etárias, oferecendo ricas oportunidades de
convívio e trocas, contribuindo para o crescimento pessoal de seus associados.
4.Considerando
que é uma educadora, como pode o educador contribuir para a elevação da
consciência e do nível de transformações sociais?
O educador deve ser um cidadão do mundo e do seu
tempo, permanentemente atualizado com o que está acontecendo e comprometido com
a mudança. A educação é um ato político, já dizia Paulo Freire e ao exercemos
nosso mister, é preciso sabermos de que lado estamos, a favor de quem educamos e contra
quem educamos. Se o educador conseguir responder a estas questões e fizer a
opção pelo mais fraco, aí sim, estaremos sendo revolucionários, aí sim
estaremos contribuindo para a mudança.
5.Sem
ser panfletária, naturalmente, crê que a Poesia deve estar comprometida com os
anseios populares e as questões mais profundas numa sociedade, ou deveria ser
neutra apenas? E o que significa neutralidade afinal?
Aprecio a leitura de poemas que me levem ao êxtase,
que fale de coisas dos céus e da terra, mas sou uma militante dos movimentos
sociais. Na minha vida sempre estive ligada a causas sociais, movimentos
reivindicatórios, por isso acredito que a poesia deve servir sim à emancipação
das minorias. Não existe neutralidade, ao optar por uma “poesia neutra”, o
poeta já fez sua escolha, já disse de que lado está.
6.Março
é o mês do Dia Internacional da Mulher. Como analisa a situação da mulher em
nosso país ou no mundo, de forma objetiva?
A memória do movimento de luta da mulher trabalhadora fabril, no
início do século XX, foi marcada por reivindicações, protestos, denúncias da
opressão sofrida nas fábricas e greves. Os baixos salários, a extensa jornada
de trabalho, o trabalho infantil, o controle de acesso aos banheiros, as portas
trancadas durante o expediente, relógios pontos cobertos, o assédio sexual e o
direito ao voto foram bandeiras levantadas por mulheres ao final do século XIX
e inicio do XX. Mulheres como Clara
Zetkin, Alexandra Kollontai, Clara Lemlich, Emma Goldman, Simone Weil dedicaram
suas vidas ao processo de conscientização e organização da mulher operária e
foi Clara Zetkin, militante do Partido Comunista Alemão, que durante o II Congresso Internacional de
Mulheres, em 1910, propôs a criação de
um Dia Internacional da Mulher. Graças a
estas companheiras e milhares de outras, que foram chegando, a situação da
mulher na atualidade tem por foco a participação política, direitos
reprodutivos e eliminação da violência contra a mulher.
6A.Tem
um livro intitulado OS PROBLEMAS DE JÚNIOR. O que poderia adiantar ao leitor da
FIANDEIRA sobre esse livro?
O personagem principal desta história é Júnior, um
menino de 4 aninhos que é chamado de negro por um coleguinha de aula. A partir
desse momento, Júnior não quer mais
voltar à escola infantil, pensa no amigo e tenta compreender as razões porque
agiu dessa forma.
7.Lançou
em 2011 um livro intitulado O SEGREDO DE AYO. Como e onde foi o lançamento e
conte-nos algo sobre esse segredo, por gentileza.
Nossa cidade, Santa Maria, localizada no coração do
Rio Grande do Sul realiza há mais de 30 anos a maior feira do livro do interior
do estado. É um período de alegria e confraternização e foi nesta feira que
lancei O SEGREDO DE AYO. Ele adora
animais, e tem Zanza, uma cadela que acabou de dar cria. Um dos cachorrinhos de
Zanza é muito chorão e o segredo se relaciona a forma como o garoto resolve
esta situação.
8.Quem é
Layla?
É uma menina negra, linda, linda. Frequenta a
classe de alfabetização e é muito feliz, até o dia em que uma nova colega chega
à escola: Valquíria. Layla tenta
estabelecer uma relação de amizade com Valquíria, mas não é aceita, até que momento,
durante uma brincadeira de roda, Valquíria se nega a dar a mão para a colega,
confessando que não gosta de pessoas negras. A partir daí, a professora propões
atividades que envolvam a (re)educação das relações raciais.
9.Tem uma
coleção chamada HISTÓRIAS DA AVÓ PRETA. A
Fiandeira quer saber tudo sobre essa coleção.
Essa coleção é composta por seis histórias: Os
Problemas de Júnior, O aniversário de Aziza, A Turma de Layla, Dia dos Negros,
O Sonho de Jamila e Zeca, um Herói Negro.
Escrevi minha primeira historinha: “Os Problemas de Júnior”, no ano de
2002, quando meu netinho chegou em casa inconsolável, por ter sido chamado de
negro por um colega. Meu objetivo era demonstrar o quanto amava meu neto, mas
aí, pensei nas outras crianças negras que sofrem discriminação diariamente e
ficam tristes, se negando a voltar para a escola. Nasceu assim meu primeiro livro. A partir daí
fui encorajada a escrever sobre situações de racismo envolvendo crianças negras
e não negras, resultando na coleção Histórias da Vó Preta, título sugerido por
meu amigo professor Júlio Quevedo.
10.O que é
o Museu Treze de Maio?
O
Museu Afro-Brasileiro de Santa Maria é um museu comunitário localizado no
prédio onde funcionou a centenária Sociedade Cultural Ferroviária Treze de
Maio, fundada a 13 de maio de 1903 e que havia fechado suas portas em virtude
de dificuldades financeiras e de gestão. É um museu construído e vivenciado
pela comunidade negra, oferecendo oficinas de dança afro, capoeira, percussão,
grupo vocal de mulheres negras, atividades técnicas e de pesquisa, além de ser
um ponto de referência do Movimento Negro local e regional.
.
11.Esteve
em São Paulo com as amigas na noite da ANTOLOGIA POESIAS 2013. Como foi para
você essa experiência?
Conhecer pessoas com as quais nos afinizamos, que
compartilhamos utopias, além de nos fortalecer, também nos enriquece. O carinho
com o qual fomos recebidas, a simplicidade de todos, sem nenhuma arrogância, permitiu
que me sentisse como se estivesse em minha casa, entre companheiros, parecendo
serem velhos amigos que há muito tempo não via.
E como foi bom revê-los. E como foi bom abraçá-los!
12.Deixe
aqui a sua mensagem final. Qual a sua PALAVRA FIANDEIRA?
Conhecer Marciano Vasques, alguém que caminha irradiando amorosidade foi um privilégio.
Encontrar um grupo que anda de braços dados com a poesia me faz acreditar que
podemos sim mudar o mundo e construirmos uma sociedade na qual o respeito, a
justiça e a fraternidade convivam harmoniosamente. Minha palavra fiandeira é igualdade. Veja só meu irmão/ Sou igual
a ti/ Ou não?
POEMA
OITO DE MARÇO
Chega!
Não quero abraços,
Nem loas,
nem mimos!
Quero gritar!
Denunciar a
dupla jornada de trabalho
Que acaba
com nossa sanidade física e mental!
Denunciar a
violência a que somos submetidas
Muitas
vezes, dentro de nossas casas!
Denunciar o
assédio sexual de colegas galanteadores,
Que minam
nossa condição feminina.
Denunciar a
fome que grassa entre nossos filhos,
Herdeiros
do desemprego e da exclusão!
Denunciar a
discriminação da elite
Que nos
acusa de termos “uma tropa de filhos”.
Se não
forem os filhos, o que será nosso?
A hipócrita
sociedade de consumo apropriou-se da data
Faz festa,
distribui rosas, oferece brindes!
Visando
sempre o lucro.
Festejar o
quê?
Chega!
Não
quero flores, nem hinos!
Quero botar
a boca no trombone:
Não há
médicos, nem pílulas nos Postos de Saúde
E ainda
falam em planejamento familiar!
Quero maternidade pra parir meu
filho!
Garantir o pré-natal,
Aconchegar meu rebento
Em águas serenas,
Sem ansiedade, sem traumas!
Não temos
acesso a exames preventivos do câncer:
de
mama...de útero...
Ou se
marcarmos,
Consulta
somente para daqui a oito meses!
Faltam
creches para nossos filhos!
Como
trabalhar, se nosso coração fica em casa, com as crianças?
Falta
escola perto de casa.
Com tanta
violência, como ficar tranqüilo se nossos filhos estão no abandono?
Para este oito de março, faço um
convite:
- Por favor, venham!
- Venham empunhar, comigo
A bandeira do respeito,
Da dignidade e do direito!
PALAVRA FIANDEIRA
Fundada pelo escritor Marciano Vasques
Ano 5 —15 Março
Edição 145
Maria Rita Py
Linda mulher, mais uma guerreira, parabens, bela fala.
ResponderExcluirQuerido poeta Marciano Vasques, agradeço sua gentileza em me brindar com esta deferência. Que possamos voar nas asas da poesia, espargindo sonhos. Gracias, gracias, gracias.
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