Amor para fiar...
eu queria saber qual era a história por trás daquele desenho...
(na entrevista)
Estudo de aquarela para um curso (Curso de Cárcamo)
PALAVRA FIANDEIRA
ARTE, EDUCAÇÃO, LITERATURA
Publicação digital de divulgação cultural
EDIÇÕES SEMANAIS
ANO 5 — Edição 146
22 de Março 2014
MÁRCIA MISAWA
1.Quem é Márcia Misawa?
—Sou ilustradora apaixonada por Literatura
Infantil e vivo em São Paulo. Tenho
formação em Publicidade pela Escola de Comunicações e Artes da USP e
pós-graduação em Educação, em que estudei o desenvolvimento moral e ético da
criança. Cresci num sítio, pratico yoga,
amo aquarela e me sinto envolvida com a infância de tal maneira que não sei
mais distinguir o que é que eu faço por profissão e o que faço por ser mãe.
Nesse minuto estou na 41a semana de gestação de meu segundo filho,
amanhã já não sei mais.
2.É ilustradora apaixonada pela Literatura Infantil. Como e quando surgiu essa paixão?
—A primeira lembrança que tenho de minha vontade de ilustrar livros
infantis é a sensação que tive ao ver uma aquarela de um passarinho amarelo em
um livro infantil japonês, antes mesmo de saber ler: eu queria saber qual era a história por trás
daquele desenho, queria pintar daquele jeito, queria desenhar história. E cresci assim, com essa imagem me
norteando. Várias vezes tentei ter uma
profissão mais “séria”, mas a paixão ganhou da razão.
3.Viveu um tempo em Madrid e conheceu amigos espanhóis que amam a
literatura infantil. Pode nos contar algo sobre esses encontros?
—Vivi na Espanha entre 2009 e 2010, com meu
marido e meu filho Bruno. Lá conheci a i
con i (http://www.iconi.es), uma escola voltada para a ilustração de
Literatura Infantil. Então participei de cursos com a Jutta Bauer, Arianna
Squilloni e Claudia Ranucci. Fiquei
maravilhada como existiam tantas pessoas lutando contra a crise do país munidas
com seus sonhos de trabalhar com Literatura Infantil. Além da rica experiência
dos cursos em si, esse intercâmbio foi muito importante para mim pelas amizades
que fiz e por me mostrar que esse mercado é restrito em todo o mundo e que
exige muito, muito amor.
Amigos em Vichuquén
4.Diz que tem um um carinho especial pelas novas mídias. Sobre uma
profecia antiga de que a era do livro de papel será extinta, e não mais
existirá o livro assim, o que tem a dizer?
—Trabalhei numa agência web por 5 anos e mais 3 como freelance, parei em
2008. De lá para cá, a Internet tomou
outra cara, mas acho que o livro no suporte digital ainda está
engatinhando. Não acho que o caminho
seja pensar nas mídias digitais como substitutos do papel, tampouco adaptar o
livro com sons e animações. Acredito que
será algo novo, diferente do livro de papel e dos games. Também acho que demorará muito para termos um
esboço do que pode vir a ser essa nova arte, justamente porque exige tempo para
amadurecer.
5.Poderia, por favor, contar aos
leitores de A FIANDEIRA sobre a sua exposição de Arte acontecida em Ilhabela?
A exposição coletiva Manchas e
Transparências foi organizada pelo Cárcamo, querido mestre de aquarela, e
foi uma mostra da produção de seus alunos, em parceria com a Prefeitura de
Ilhabela. Além de ser, na minha opinião,
o nome mais importante dessa arte no país, ele é um professor muito generoso e uma
pessoa de coração grande. Tivemos a
segunda edição da exposição no ano passado, em São Paulo.
Exposição Manchas e
Transparências 2013, em São Paulo
6.”O conteúdo moral
na Literatura infantil”, eis o eixo condutor de seu TCC. Pode nos dar uns
toques sobre a sua abordagem?
—Essa pesquisa foi fundamentada na
teoria de Piaget e teve como intuito auxiliar os professores a atuarem como
mediadores em discussões sobre questões morais a partir de obras da Literatura
Infantil.
A chave está em não apresentar o
ponto de vista já pronto do educador, através de pura transmissão do que é
certo e errado. A criança pode até
reproduzir as falas, decorar aquilo que é aprovado pelos adultos, mas dessa
maneira ela não se desenvolve moralmente.
É necessário que haja vivência da situação, discussão entre pares, que a
criança tenha oportunidade de pensar no seu ponto de vista e na do colega e
então chegar a uma própria conclusão.
E a seleção das obras é
importante pois nem sempre a existência de um conteúdo moral numa história
possibilita discussões. Ainda há
histórias que só reforçam a heteronomia, a necessidade de ser sempre guiado por regras pela
incapacidade de compreender o porquê delas existirem. Em Chapeuzinho Vermelho, por exemplo, tudo o
que acontece mostra que ela não deveria desobeder à mãe, que as crianças devem
obedecer. Para os adultos a obediência
parece linda, mas imagine uma situação em que a pessoa deve optar entre ser
obediente e salvar uma vida, o que é prioridade?
A literatura pode auxiliar a
criança a priorizar valores.
7.Ilustrou
o livro BICHO HOMEM de Nelson Albissú. Esse livro tenho aqui comigo. O autor me
presenteou num encontro no “Ceu Quinta do Sol”. Poderia nos contar sobre as
suas emoções ao ilustrar um livro infantil?
—Tenho muito carinho por esse livro do Nelson Albissú. Ele começou a ser ilustrado em Madrid, os
desenhos atravessaram o oceano e foram terminados aqui em São Paulo. Ele marcou um momento importante de minha
vida, de transição, de retorno.
Cada história que ilustro é um mergulho profundo, tem que ser. Para que as ilustrações conversem com o texto
e com o leitor é preciso que tenham, elas mesmas, muito a dizer. Eu não consigo, por exemplo, preencher uma
página com elementos puramente estéticos.
Os desenhos me pedem que lhes dê emoções, histórias, sensações.
Ilustração para Bicho Homem,
de Nelson Albissú, Cortez Editora
8, Já fez ou pensou em realizar algum
projeto de Histórias em Quadrinhos?
—Apesar de ter desenhado muitas
meninas de olhos grandes quando era bem pequena, nunca fui de desenhar
histórias em quadrinhos. É inevitável
imaginar o mangá quando se juntam as palavras “japonês” e “desenho”, né? Para mim essa associação me deu trabalho,
porque as primeiras referências que tive na infância tinham origem no mangá mas
não era isso que eu buscava. Na
adolescência, quando colocamos na balança tudo o que aprendemos até então,
passei a me afastar da cultura japonesa como necessidade de me sentir mais
brasileira. Depois, a tão importante
valorização da cultura brasileira que eu via pelos corredores da faculdade me
dava um nó na cabeça, porque me obrigava a sentir orgulho de uma cultura que
não eram minhas raízes. Por outro lado,
eu também não me sentia bem acomodada na cultura japonesa. Aos poucos fui me acostumando com essa
sensação de ser sempre meio estrangeira.
E hoje acho o máximo ter a possibilidade de mostrar na prática ao meu
filho mesticinho pontos de vista diferentes, de culturas diferentes.
Ilustração para Arca de
haicais, de Lena Jesus Ponte, Paulinas Editora
9
É uma divulgadora de cursos, eventos, laboratórios artísticos... Ou seja, uma
atuante ativista na difusão cultural na Rede.
É possível atualmente se pensar na comunicação entre os humanos sem esse
meio?
—Fiquei muito contente de passar
essa impressão, porque eu demorei tanto para encontrar a portinhola que levava
ao país das maravilhas dos cursos e eventos da área que tenho o maior prazer em
divulgar. Vejo que não são todas as
áreas que dependem das redes sociais, mas ao menos em Arte, Literatura Infantil
e Ilustração elas permitiram um intercâmbio muito significativo.
10.Por
curiosidade, qual o primeiro livro por você ilustrado, e por acaso tem algum
livro no qual seja também a autora?
—O primeiro que ilustrei foi No
oco do toco, um livro de haicais da querida Edméa Campbells, pela Paulinas,
publicado em 2009. E ainda não saiu meu
primeiro livro como autora também, mas está no prelo! Vai se chamar Cartas ao papai, sobre
saudade, angústia e compreensão.
No oco do toco, de Edméa
Campbells, Paulinas Editora
11.Lendas
de frutas e árvores do Brasil . Eis uma obra por você belamente
ilustrada. Pode, gentilmente, nos comentar algo sobre esse livro, visto a
importância do tema?
—Foi o autor Adriano Messias quem gentilmente me indicou para
a Editora de Cultura e significou uma experiência muito enriquecedora para
mim. Recomendo o livro! É uma oportunidade de conhecer lendas de
origem indígena, negra e cabocla ligadas a plantas brasileiras, como o guaraná,
o inhame, a erva-mate, o açaí...
Ilustração de capa para Lendas
de frutas e árvores do Brasil, Adriano Messias, Editora de Cultura
Ilustração de Lendas de frutas e árvores do Brasil
12.Deixe
aqui a sua mensagem final. Qual a sua PALAVRA FIANDEIRA?
—Amor para fiar, ética para arrematar! Um grande abraço a todos os leitores.
PALAVRA FIANDEIRA
Fundada pelo escritor
MARCIANO VASQUES
ANO 5 —146
MÁRCIA MISAWA
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